quarta-feira, 24 de março de 2010
Paulo Souto: "Ninguém nunca me falou em ser vice de Serra"
Incluído na lista de políticos cogitados pelo DEM para a vice de José Serra (PSDB), o ex-governador da Bahia Paulo Souto vive seus dias de "bom nome para..." e "um nome que todos nós...". Líder do DEM na Câmara, o deputado federal Ronaldo Caiado definiu: "Paulo Souto é um nome que todos nós nos sentimos bem representados". Ex-comentarista esportivo da Rádio Cultura de Ilhéus (BA), na juventude, Souto identifica o momento de fechar a zaga, antes que as especulações em torno de sua vice-candidatura ganhem intensidade:
- Ninguém nunca me falou sobre esse assunto. Nunca. Veja bem, esse negócio de vice é uma coisa que depende, essencialmente, do titular (José Serra). Então, se qualquer coisa relacionada a vice não tem essa origem clara, não consigo levar muito a sério - diz o democrata, direto de seu escritório político, em Salvador.
Quem pôs o jabuti na árvore (licença, Vitorino Freire), Souto ainda não sabe. Nem mesmo se as cogitações partiram do território amigo.
- O projeto no qual eu estou realmente engajado é essa coligação com o PSDB, que deve apresentar uma chapa completa para o governo do Estado e deve estar vinculada à candidatura do PSDB nacional. Esse é o projeto. Fora disso, até agora, é especulação - desfaz.
Formado em Geologia, governador da Bahia por duas vezes - vinculado ao grupo político do ex-líder baiano ACM - e presidente do diretório estadual do Democratas desde 2007, Paulo Souto critica a cooptação de adversários empreendida por Jaques Wagner (PT), atual ocupante do Palácio de Ondina.
- O objetivo do governo é cooptar forças políticas, as mais díspares, pra transmitir uma aparente e artificial situação de vitória nas eleições. E pra isso faz qualquer coisa, não está olhando a identidade, as questões conceituais, programáticas, ideológicas... Nada disso vale. É juntar de qualquer forma.
Nesta entrevista a Terra Magazine, ele aponta falhas da gestão petista na segurança, educação e saúde. Souto cobra políticas públicas para combater a "interiorização da violência".
- Isso é uma coisa muito grave. Nós estamos assistindo a um extermínio de jovens na Bahia. Um verdadeiro holocausto.
Confira a íntegra da entrevista.
Terra Magazine - O nome do senhor foi incluído entre os possíveis indicados do DEM para a vaga de vice de José Serra, na campanha presidencial. Existe alguma articulação nesse sentido?
Paulo Souto - Ninguém nunca me falou sobre esse assunto. Nunca. Veja bem, esse negócio de vice é uma coisa que depende, essencialmente, do titular. Então, se qualquer coisa relacionada a vice não tem essa origem clara, não consigo levar muito a sério. É claro que quando você faz uma lembrança dessa, pode deixar as pessoas satisfeitas, mas, consistência, isso não tem.
Como dizia o ex-senador maranhense Vitorino Freire, jabuti não sobe em árvore, alguém põe lá. Como é que surgiu seu nome nessas conversas?
Não sei se essa fonte é o próprio Democratas, que, em algum momento, volta a pensar em ter a indicação do vice. Esse assunto não foi tratado comigo. Eu poderia até me valorizar. Isso não tem qualquer consistência. E não estou falando especificamente com relação a mim. Só terá qualquer valor no momento em que se enxergue que está partindo também do que será candidato a presidente. Fora isso, acho que não tem sentido.
O senhor teria que avaliar também o quadro das eleições proporcionais na Bahia, que dependem de sua candidatura? Deputados federais, estaduais...
Só pra concluir, o projeto no qual eu estou realmente engajado é essa coligação com o PSDB, que deve apresentar uma chapa completa para o governo do Estado e deve estar vinculada à candidatura do PSDB nacional. Esse é o projeto. Fora disso, até agora, é especulação. Nem gosto de falar sobre isso. Como não sei de onde partiu, como tudo que não tem uma origem clara, você fica falando sobre o quê? Nada.
Mas, se isso evoluir pra uma sinalização do governador José Serra, o senhor pode começar a conversar?
Olha, meu plano, mais uma vez, é compor a aliança com o PSDB e apresentar uma chapa ao governo da Bahia. Fora disso, é falar sobre hipótese. E não é prudente falar sobre hipótese.
Uma aliança com Geddel Vieira Lima, do PMDB, na Bahia, ainda é possível? Há alguma ponte para isso?
Veja bem, é muito claro o nosso desejo de ter um candidato a governador. E é muito claro, e tem que ser entendido, o desejo do PMDB de ter um candidato a governador. Agora, nas condições atuais, não vejo como fazer uma aliança pro governo.
E a situação da candidatura José Serra no Nordeste? Como tem se desenvolvido o nome dele na região?
Ninguém pode negar: o presidente Lula é realmente muito forte no Nordeste. Mas isso não pode ser confundido com o que vai acontecer na hora que ficar claro que o candidato não é Lula e os candidatos serão outros, o Serra e a ministra Dilma. Aí você vai ter uma ideia de como vai ser essa disputa.
Depois do escândalo do governo do Distrito Federal, especula-se um impacto para o DEM nas eleições de 2010. Como o senhor avalia?
O Democratas é um dos poucos partidos que, focalizado esse assunto, terá mais tranquilidade do que qualquer outro para fazer sua defesa. Foi o único partido que agiu, reconheceu a seriedade do problema e tomou providências que, por exemplo, o PT não tomou. Ao contrário, todo eles continuam no partido, alguns foram promovidos. Querer atribuir problemas ao Democratas por causa disso, não tem o menor cabimento.
Como deve ser o posicionamento do Democratas em relação ao governo do presidente Lula? No PSDB, o governador mineiro Aécio Neves defende que sejam reconhecidos os avanços da gestão de Lula. É uma estratégia eleitoral mais inteligente?
Reconhecer avanços, mas também não deixar de reconhecer que esses avanços, muitos deles, tiveram origem em administrações anteriores. Por exemplo, toda a situação macroeconômica que permitiu agora o Brasil estar numa situação boa, o início dos programas sociais, além de outros acertos... Isso é uma coisa normal. Mas também não deixar de reconhecer os problemas. Enfim, acho que a discussão não é sobre o presidente Lula. A discussão vai ser sobre os candidatos que estão sendo colocados para a população.
Não será uma eleição plebiscitária?
Quero dizer que não vai ser no sentido de aprova ou não aprova o governo Lula. O problema é saber quais são as condições que os novos candidatos vão apresentar ao eleitorado.
Quais são as críticas que o senhor faz ao governo de Jaques Wagner, do PT, na Bahia?
Olha, primeiro, a coisa que salta mais à vista é a deterioração completa dos serviços públicos essenciais: segurança, saúde e educação. Colapso. A Bahia é hoje o Estado onde a violência mais cresce no Brasil. Infelizmente, estão se acumulando com muita gravidade os problemas do atendimento à saúde, sem nenhum tipo de progresso na área de educação. Você imagina que 90% da nossa população não têm um plano de saúde, precisa do serviço de saúde pública de qualidade? Talvez 85% das nossas famílias coloquem seus filhos nas escolas públicas. E 100% de nós precisamos da proteção do Estado em relação a nossas vidas. O problema de segurança é muito sério, rapaz. Nós estamos falando em taxas de homicídio, por exemplo em Salvador, cinco ou seis vezes maiores do que São Paulo.
Segundo o governo, o problema da segurança se deve, em grande parte, à explosão do consumo de crack. É um argumento plausível?
Primeiro, o seguinte: citar números de que tantos porcentos dos homicídios se devem ao crack é uma coisa... Não entendo como o governo pode dizer isso se ele não consegue elucidar 90% dos assassinatos. Como ele pode dizer isso? É uma mágica. Segundo, ainda que fosse isso, a pergunta é: o que objetivamente foi feito pra minorar essa situação? Outro problema é a interiorização da violência. Estou falando de Salvador e da Região Metropolitana, mas isso está chegando às pequenas cidadades, à zona rural. Isso é uma coisa muito grave. Nós estamos assistindo a um extermínio de jovens na Bahia. Um verdadeiro holocausto.
E o que poderia ser feito para minorar o problema da violência?
A primeira coisa que me parece básica: a polícia perceber minimamente no governo uma intenção clara de dar prioridade àquele que é o principal problema da Bahia neste momento. Está faltando liderança, comando do governo do Estado, pra poder transmitir à polícia a importância que o governo dá ao trabalho das duas polícias na questão da segurança pública. Em nenhum momento aconteceu. É sempre a desculpa do crack, às vezes se reportando ao governo anterior. São sempre desculpas de não tomar a si o problema. O governo já devia ter demonstrado que é um problema de Estado, "eu tenho que entrar nisso pra mostrar à população que nós vamos mudar". E até nas coisas operacionais... Você teve no ano passado um orçamento de segurança pública, para investimento, de R$ 140 milhões. Aplicaram R$ 22 milhões naquele que é o problema mais grave do Estado! Quando é que você vai perceber que o governo está dando importância a isso? Não está.
Como o senhor avalia a revoada de seus ex-aliados e do grupo do ex-senador Antonio Carlos Magalhães para o governo Jaques Wagner? É algo enriquecedor para a política estadual?
Isso não tem nada de enriquecedor. (ri) Não estou achando que há essa revoada toda...
Há dois casos "clássicos": os ex-governadores César Borges (PR) e Otto Alencar (PP).
César Borges, pelo menos, eu não... Pode até acontecer, mas não vi ainda o martelo batido, como se diz. Há algum tempo ele está num partido que tem uma alinhamento com o governo federal. É evidente que, tradicionalmente, era uma figura do nosso grupo. Quero falar mais em tese sobre essas coisas. O que está acontecendo? Esse é outro problema na Bahia. O governo só pensa na reeleição. É capaz de fazer qualquer coisa, do ponto de vista político, pensando apenas na reeleição. Só pensa nisso. Disso decorrem vários problemas na área de administração, que está colocada num plano absolutamente secundário. O objetivo do governo é cooptar forças políticas, as mais díspares, pra transmitir uma aparente e artificial situação de vitória nas eleições. E pra isso faz qualquer coisa, não está olhando a identidade, as questões conceituais, programáticas, ideológicas... Nada disso vale. É juntar de qualquer forma, pra dar uma visão antecipada, que pra mim é artificial, de que vai ganhar as eleições. Isso pode ser bom para os políticos, mas é péssimo para o povo quando se faz aliança desse tipo.
Agora, no governo do ex-governador ACM e no seu também, esse vira-casaquismo ocorreu. Essa não é uma tradição da política baiana?
Tá bom. Eu não conheço figuras importantes do PT que tenham sido atraídas por nós. Não lembro. A política é isso, já estou acostumado: qualquer coisa que se aponta, se diz: "não, vocês também faziam". E a gente fazia como? Mostre. E não se mostra. Tá bom, eu diria que...
Prefeitos de interior...
Prefeitos, mas nunca com a intensidade com que o governo está se voltando agora pra fazer isso. Isso é perda de identidade.
Para o PT?
Isso. Ele está mostrando que não tem nenhum tipo de preocupação. Ele quer fazer um mix de forças políticas pra passar a impressão de que vai ganhar as eleições de qualquer jeito. Como disse, isso pode ser bom pra ganhar a eleição, bom para os políticos, mas é péssimo para a população. Quem não sabia que não ia dar certo a aliança do PT com o PMDB na Bahia? Todo mundo sabia. Não deu. Outro dia o governador disse que gastava 30% do tempo dele pra administrar os problemas com o PMDB. Não é razoável que alguém gaste 30% do tempo pra isso, enquanto a gestão está da forma como está.