quinta-feira, 28 de outubro de 2010
Empate no Supremo mantém Lei da Ficha Limpa em vigor
Após mais de seis horas de discussão e diante de um novo impasse, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quarta-feira (27) que o empate sobre a validade da Lei da Ficha Limpa deve ser interpretado em favor da decisão questionada. Continua valendo, desse modo, o entendimento do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) que aplicou a norma para as eleições 2010.
Peluso diz que solução é artificial
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Todos os ministros mantiveram os votos, e a análise sobre a aplicação da lei terminou novamente com um placar de 5 votos a 5. O plenário julgou recurso do candidato ao Senado Jader Barbalho (PMDB-PA), que foi definitivamente barrado por ter renunciado ao mandato em 2001.
Em debate acalorado, os ministros rejeitaram desempatar a questão com voto de qualidade do presidente da Corte, Cezar Peluso, ou esperar até que um novo ministro fosse nomeado para a vaga do aposentado Eros Grau.
Somente a discussão sobre o desempate durou mais de duas horas. A maioria, sete contra três, seguiu a proposta de Celso de Mello, de que o empate significa que prevalece a lei impugnada. Quatro ministros, no entanto, manifestaram preocupação com a solução encontrada.
“Tenho para mim que qualquer que seja a alternativa adotada para solucionar este caso, é sempre uma solução ficta”, repudiou Cezar Peluso, que fez questão de salientar que, contra sua opinião pessoal, proclamaria o resultado. “Eu disse que era uma decisão artificial, e de fato o é. (...) E é simplesmente pelo fato óbvio que não há maioria que decidiu. A solução aqui é recorrer à ficção. É como se houvesse uma maioria que decidiu. Mas não a há. Estamos num conjunto de impasses sucessivos. (...) Me parece que o prestígio da Corte está sendo posto em xeque. (...) A história nos julgará."
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“O voto de qualidade pode ser inconveniente, mas não há nenhuma base para declará-lo inconstitucional”, defendeu Gilmar Mendes, que ironizou a discussão. “Daqui a pouco par ou ímpar, jogar dado, chamar um mago.”
“Para mim processo não tem capa, tem conteúdo. Não haverá decisão no caso concreto”, completou Marco Aurélio. Segundo ele, é como se o STF não tivesse recebido o recurso. “Que o Supremo não lave as mãos, que não deixe de se pronunciar”, apelou aos colegas.
O recurso de Barbalho, que teve o registro de candidatura barrado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), é semelhante ao de Joaquim Roriz (PSC-DF), que terminou em impasse entre os ministros. O Supremo já havia reconhecido a repercussão geral, e o entendimento no caso deverá ser seguido pelos tribunais inferiores em processos idênticos.
Casos como o de Paulo Maluf (PP-SP), barrado por ter uma condenação judicial, não se enquadram no entendimento e terão de ser decididos um a um, o que pode trazer novamente a discussão ao Supremo. Até lá, um 11º ministro pode ser nomeado pelo presidente Lula, encerrando o empate.
Votos
Como relator do caso, o ministro Joaquim Barbosa, votou para aplicar a lei imediatamente. Ele afirmou que o tema já foi “exaustivamente discutido” no recurso de Roriz e manteve o voto que proferiu naquele julgamento.
Tenho para mim que qualquer que seja a alternativa adotada, é sempre uma solução ficta. (...) E é simplesmente pelo fato óbvio que não há maioria que decidiu. Me parece que o prestígio da Corte está sendo posto em xeque. (...) A história nos julgará
Cezar Peluso, presidente do Supremo Tribunal Federal
A comparação à liberação de Valdemar Costa Neto, decidida na noite desta terça (26) pelo TSE, provocou a primeira discussão no plenário. Envolvido em denúncias de participação no esquema do mensalão, ele renunciou ao cargo de deputado federal para evitar ser cassado.
Durante o voto de Marco Aurélio de Mello, Gilmar Mendes chamou a decisão do TSE de “casuísmo jurisprudencial”. O presidente do TSE, Ricardo Lewandowski, e a ministra Cármen Lúcia, relatora, defenderam a decisão. “Repilo qualquer insinuação de que o TSE esteja fazendo casuísmo jurisprudencial”, disse Lewandowski.
“Dificilmente vai se encontrar um caso de mais escancarada, de mais escarrada, desculpem a expressão, de retroatividade”, disse Gilmar Mendes, para quem há a possibilidade de “manipulação das eleições, porque vai se escolher candidato”. “Devemos ficar advertidos desses excessos de moralismos. Em geral, descambam em abusos quando o são notória e notoriamente falsos.” O ministro, em seu voto, classificou a aplicação imediata da norma de “convite para um salão de horrores”.
Assim, a votação sobre o caso terminou em 5x5 novamente. Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Ellen Gracie, Joaquim Barbosa e Ayres Britto voltaram a se manifestar pela aplicação imediata da lei. Foram contra Marco Aurélio, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso.
Seria possível alguém que renunciou para não sofrer um processo ético, que usou o direito de não se autoincriminar, agir contrariamente ao direito, ter praticado um ato contrário à probidade administrativa ou a moralidade por exercício do cargo?
José Eduardo Alckmin, advogado de
Jader Barbalho
O advogado de Jader Barbalho, José Eduardo Alckmin, chegou a pedir a suspensão do julgamento até que outro ministro fosse nomeado. “Essa Corte não pode ficar paralisada”, rebateu Celso de Mello. “O tribunal deve procurar meios para superar esse impasse.” A maioria também rejeitou o adiamento.
Entenda a decisão sobre a Ficha Limpa
O STF começou a julgar a aplicação da norma em setembro, mas um impasse adiou a decisão até que outra contestação chegasse à Corte. Diante da indefinição e de decisões conflitantes da Justiça Eleitoral, candidatos mantiveram-se na disputa e, sub judice, receberam votos -que permanecem zerados enquanto não há decisão final sobre seus registros.
Jader Barbalho, segundo candidato ao Senado mais votado no Pará, foi barrado pela Lei da Ficha Limpa porque renunciou ao mandato de senador em 2001, para escapar de possível cassação por quebra de decoro.
A diferença com relação a Roriz é que Barbalho obteve o deferimento de seu registro de candidatura por duas vezes após ter renunciado. E foi eleito, em 2002 e 2006. Assim, sua defesa alegou que a retroatividade da lei iria prejudicar o candidato.
Fica muito evidente neste caso, talvez até mais que em outros, que a gravidade das denúncias objeto das representações oferecidas no Senado era tamanha que dificilmente haveria como impedir-se a cassação do mandato do senador Jader Barbalho. Não se tratava apenas de uma opção de conveniência política
Roberto Gurgel, procurador-geral da República
Pela Lei da Ficha Limpa, o político que renunciar para não ser cassado fica inelegível por oito anos após o fim do mandato que cumpriria. Antes, eram três anos. A legislação também barra candidatos com condenação por decisão colegiada (por mais de um desembargador).
Demora
A divisão da Corte provocou desgaste. Os ministros foram unânimes em considerar a lei constitucional, mas cinco votaram para aplicar a norma nestas eleições, enquanto outros cinco entenderam que a aplicação imediata fere direitos dos candidatos, pois não entrou em vigor um ano antes da eleição como exige a Constituição.
Com a aposentadoria do ministro Eros Grau, para cuja vaga o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda não nomeou substituto, coube aos ministros decidirem se haveria desempate. Uma das possibilidades seria o voto de desempate do presidente, que votaria duas vezes. Sem consenso, o julgamento foi adiado.
Roriz contestou o mesmo ponto da legislação, mas o recurso perdeu o objeto depois que o candidato desistiu de concorrer ao governo do Distrito Federal para indicar a mulher, Weslian Roriz, em seu lugar na chapa.