Os ministros do Superior Tribunal Militar desautorizaram decisão do presidente da corte e liberaram à Folha acesso aos autos do processo que levou a presidente eleita Dilma Rousseff (PT) à prisão, na ditadura (1964-85).
O jornal havia protocolado no tribunal mandado de segurança para ter respeitado o direito constitucional de poder acessar os documentos.
O presidente do STM, Carlos Alberto Soares, ao negar acesso, por duas vezes, alegou que queria evitar uso político dos documentos.
Em nova sessão marcada por discussões, dez ministros do tribunal votaram pela liberação do acesso. Para eles, trata-se de um "processo histórico", por isso o veto configurava censura e ia contra a liberdade de imprensa.
Somente o relator do mandado de segurança, Marcos Torres, votou contra. Segundo ele, o jornal, ao consultar os documentos, iria invadir a intimidade e a privacidade da presidente eleita.
A ministra Maria Elizabeth Rocha, que assessorou Dilma na Casa Civil, votou pela publicidade do processo, mas fez a ressalva de que todo e qualquer relato de tortura deveria ser mantido sob sigilo, para se preservar a intimidade dos envolvidos.
Esse argumento também foi rejeitado pelos demais ministros do tribunal. "Não existe liberdade de imprensa pela metade", disse o ministro Artur Vidigal de Oliveira.
Fernando Sérgio Galvão, que já tinha se posicionado contra o acesso ao processo, mudou de opinião, votando a favor do jornal.
O julgamento da ação havia sido suspenso duas vezes --a última, em 19 de outubro, após pedido da Advocacia-Geral da União para se manifestar.
Ontem, na retomada da sessão, a AGU argumentou que Dilma e todos os demais réus no processo, mais de 70, deveriam ser ouvidos antes da liberação dos papeis. Os ministros do STM, contudo, também rejeitaram o pedido.
A Folha poderá consultar o processo após a publicação da ata da sessão, o que deve ocorrer na próxima semana.
O vice-presidente do STM, William de Oliveira Barros, que presidiu a sessão (ele não votou), disse que, "a princípio", somente a Folha terá acesso aos autos, já que "foi ela quem pediu". Ele substitui o presidente da corte, Carlos Alberto Soares.
Taís Gasparian, advogada do jornal, comemorou a decisão, "uma vitória não só da Folha, mas de toda a sociedade". "O STM honrou com sua tradição liberal. É uma vitória um pouco óbvia, já que esse processo jamais poderia ficar sob sigilo."
Em agosto, a Folha revelou que o processo de Dilma foi trancado em um cofre do tribunal, em março, por decisão do presidente do STM.
Além de querer evitar uso político do processo, Soares disse que os documentos estavam deteriorados.
Arquivado desde 1970, o processo traz informações de Dilma e outros militantes que atuaram na VAR-Palmares, organização da esquerda armada. Presa no início de 1970, ela foi condenada por subversão, torturada e solta no final de 1972.