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A BIBLIA É A PALAVRA DO DEUS VIVO JEOVÁ.

A BIBLIA É A PALAVRA DO DEUS VIVO JEOVÁ.
DISSE JEOVÁ DEUS: Pois Jeová falou: "Criei e eduquei filhos, Mas eles se revoltaram contra mim. O touro conhece bem o seu dono, E o jumento, a manjedoura do seu proprietário; Mas Israel não me conhece, Meu próprio povo não se comporta com entendimento.” Ai da nação pecadora, Povo carregado de erro, Descendência de malfeitores, filhos que se corromperam! Abandonaram a Jeová".Isaías 1:1-31

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

a vida digital tornou o conceito de traição mais evidente


Escrevi os originais de meu mestrado em uma máquina de escrever. Tive um fax modem e joguei Donkey Kong. Juro que já existiram pessoas pagando fortunas por um celular tipo tijolo depois de esperar a vida toda por um telefone fixo. Sei o que é a internet antes da banda larga. Vi, com estes olhos que a terra há de comer, o primeiro video--clipe, se é que você pode imaginar um tempo no qual não existia a MTV. Assisti à morte do vinil, da indústria fotográfica e fonográfica. Cala fundo em mim a lenta agonia do CD. Sou da época em que computadores tinham sólida e insuperável identidade: 286, 386, 486. Deveria haver algum privilégio em ser da primeira geração, ou pelo menos algum orgulho de ter vivido alguma coisa pela primeira vez.


O filme Meia-noite em Paris, de Woody Allen (2011), explora justamente esse fascínio retrospectivo causado pelas gerações que inventaram coisas que pareciam fazer a vida valer a pena: a era áurea do jazz e do surrealismo nos anos 20, o filme noir e suas divas dos 40, o existencialismo sartriano do pós-guerra, a turma beatnik da contracultura. Eu me contentaria em ter assistido ao Dark side of the moon ou visto os Beatles. Serve The Who ou Stones. Estaria satisfeito até mesmo com bossa-nova, jovem guarda e tropicália. Se não for possível troco tudo por alguns seminários de Lacan ou Foucault.


Pressinto que as gerações vindouras olharão para trás a nos respeitar como aquela turma dos antológicos e inesquecíveis Google, Facebook e Wikipedia. Somos os primeiros a viver esta vida digital e os últimos a lembrar como éramos antes disso. Mas será que alguém realmente vai cobiçar a experiência inédita de ver aparecer na sua frente, magicamente, um e-mail? Antigamente havia uma propaganda que dizia: o primeiro sutiã a gente nunca esquece. Se não me engano foi vencedora do Leão de Ouro do festival de Cannes nos anos 80. A fórmula funciona, mas não é por causa do sutiã, é por recuperar a força insondável, que habita cada um de nós, em torno da primeira vez.


Somos absolutamente fiéis à primeira vez, para o bem e para o mal. Acho que não foi por outro motivo que Freud estabeleceu esta regra de ouro clínica de que é preciso prestar muita atenção às comunicações iniciais do paciente. Fixar bem as primeiras sessões. Reter a forma precisa na qual algo é dito pela primeira vez. Perto da primeira vez, as outras são apenas cópias impuras e mal-acabadas. É por isso que o passado se torna nosso baú fetichista. Nele podemos imaginar a primeira vez que presidiu a constelação de desejos que nos concebeu. A forma mais pura e intangível da primeira vez, antes mesmo que ela tenha existido para nós, a arquiprimeira vez, a mãe de todas as primeiras vezes.


Acontece que é difícil permanecer fiel a uma experiência cuja verdade nos é desconhecida e, principalmente, uma coisa que parece feita para destruir todas as fidelidades constituídas. No fundo, a maior parte desta novidade que é a vida digital segue a máxima mais do mesmo: trabalhar mais, mais rápido, mais interligado, mais fácil, mais solitariamente – mesmo acompanhado. Mas há uma coisa na qual ela realmente inovou: no modo de destruir fidelidades. Históricos da web, torpedos mal apagados, e-mails equivocados são fontes permanentes de devastação amorosa. A vida digital tornou o conceito de traição imensamente mais elástico, flexível e discutível, disponibilizando o resgate nunca antes possível de figuras de nosso histórico desejante mais longínquo. Ou seja, uma enxurrada de primeiras vezes, para todos os gostos e sabores, do pré-primário ao colegial (leia-se ensino médio). Espero que não, mas acho que seremos lembrados como a geração que inventou a baixa fidelidade generalizada.

FONTE:UOL
Christian Ingo Lenz Dunker- psicanalista- professor livre-docente do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP)