quarta-feira, 12 de setembro de 2012
Na cidade com menos habitantes do Brasil, vereador é eleito com diferença de um voto
Apontada pelo Censo 2010 como a cidade com menor número de habitantes no país (são apenas 805 moradores), Borá (487 km de São Paulo) tem dois candidatos a prefeito. Um deles concorre à reeleição, Luiz Carlos Rodrigues (PT), mais conhecido como Luiz do Açougue. O outro, é Nelson Celestino Teixeira (PSDB), que já foi prefeito da cidade por quatro vezes. Outros 38 candidatos concorrem a 9 cadeiras do Legislativo. A disputa contava com 40 candidatos, mas duas pessoas renunciaram.
O fato de a cidade ter poucos habitantes não significa que ser eleito em Borá seja mais fácil do que em municípios com populações maiores. Nas eleições de 2008, por exemplo, o quarto vereador mais votado teve apenas um voto a mais que o quinto colocado. Foram 36 contra 35. O mesmo ocorreu entre o sexto e o sétimo mais votados: 33 contra 32.
O UOL visitou Borá dentro do projeto UOL pelo Brasil --série de reportagens que percorre municípios em todos os Estados do Brasil durante a campanha eleitoral deste ano.
Ganhei por um voto do meu suplente. Se no dia da eleição eu brigo com a minha esposa, eu empatava:
Robson Donley, vereador cassado e candidato à reeleição pelo PSB
“Eu ganhei por um voto do meu suplente: tive 32, e ele, 31. Se no dia da eleição eu brigo com a minha esposa, eu empatava”, brinca Robson Dolney, vereador e candidato à reeleição pelo PSB. Após a visita do UOL, Dolney teve seu mandato cassado por infidelidade partidária, mas declarou que irá recorrer junto ao TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral). A decisão, porém, não interfere na candidatura dele.
Além da disputa acirrada, há critérios da legislação eleitoral que fazem com que, mesmo que tenha uma quantidade suficiente de votos, o candidato não possa assumir a vaga. Um deles, por exemplo, é o quociente eleitoral, que define quais partidos terão mais cadeiras no Legislativo. Outro exemplo é o artigo 110 do Código Eleitoral, segundo o qual quando dois candidatos têm a mesma quantidade de votos, quem assume a vaga é o mais velho.
Para garantir votos, a estratégia de campanha dos candidatos acontece como na maioria das cidades pequenas: de porta em porta. “Aqui a campanha tem que ser na sola do sapato. É na unha, como debulhar milho”, explica o ex-prefeito Nelson Teixeira.
Em Borá existem mais eleitores do que habitantes: são 1.071 votantes. Moradores dizem acreditar que algumas pessoas tenham se mudado da cidade, mas não tenham transferido seus títulos. A cidade, porém, corre o risco de perder o "título" de cidade com o menor número de moradores. As últimas estimativas populacionais do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), divulgadas em 31 de agosto, mostram que o município mineiro de Serra da Saudade empatou com Borá, cada um teria 807 habitantes.
Em algumas casas e famílias, há mais de um candidato. É o caso de Marcia Luciane Silva dos Santos, candidata a vereadora pelo PTB, que disputa com o pai, Carlinho Zica (PSB), com o irmão, Angelo Aparecido da Silva (PSDB), e com o marido, que concorre com o nome de Paulo Mecânico (PSB). A aposentada Aparecida Merci, mãe de Marcia e de Angelo, brinca que terá que fazer um sorteio para decidir de quem será
Sebastião Carlos Pietro (PMDB), o Carlinhos Dengue, tenta se reeleger vereador e, há poucos dias, tinha a mulher dele, Vanda Paulino Pietro, como uma das candidatas ao Legislativo pelo mesmo partido. Ela renunciou em 3 de setembro. Entretanto, quando concedeu entrevista ao UOL, no início de agosto, Carlinhos Dengue já indicava que a mulher não seria uma concorrente de fato. Segundo ele, Vanda entrou na disputa apenas para que fosse preenchida a cota de gêneros prevista em lei. Esta legislação exige que todo partido ou coligação reserve o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo. “A gente precisava de uma quantidade de mulheres para se candidatar em cada partido, aí resolvi chamar minha mulher para me dar esse apoio”, conta.
Fundador de Borá fugiu da política temendo ser passado para trás por ter pouco estudo:
Manoel Caldas, 96, não entende o porquê de repórteres o procurarem. Desde que o IBGE anunciou a pequena e bucólica Borá como a menor cidade brasileira em número de habitantes, o município passou a chamar atenção. E quem quiser conhecer Borá de verdade precisa passar na casa de Caldas, que vive em uma residência simples na beira da estrada BOR-011, que liga a cidade ao município de Paraguaçu Paulista. Ele sempre morou no local.
Junto ao escrivão Manoel Gallo, em 1964, ele procurou o então governador do Estado de São Paulo, Ademar de Barros, para questionar o que era necessário para que a comunidade onde vivia, área rural de Paraguaçu Paulista, se emancipasse. De volta, fizeram o que lhes foi informado: um plebiscito que resultou na criação de Borá.
Caldas contrariou o tio, um político da cidade vizinha que temia com isso perder eleitores, e fundou com o escrivão o que hoje é Borá. Embora fosse provável que se elegesse a cargos públicos com facilidade, ele diz que nunca quis se candidatar a prefeito. Foi vice por apenas uma vez. O motivo? Medo de ser passado para trás por ter pouco estudo.
Com poucas oportunidades de trabalho, moradores de Borá acumulam funções
Se a maioria das cidades pequenas sofre, em geral, por ter poucas oportunidades de trabalho para oferecer a seus moradores, Borá não fugiria da regra. De acordo com o IBGE, o município tem 597 pessoas com 18 anos ou mais, ou seja, aptos a trabalhar com carteira assinada (excetuando os adolescentes que poderiam trabalhar como menores aprendizes).
As principais alternativas de trabalho no município estão na Usina Ibéria, que contrata 190 moradores, e a prefeitura, que emprega 110. O comércio também é escasso. Há apenas uma farmácia, um açougue, uma padaria, três bares, uma lotérica, dois pequenos mercados, um posto de gasolina, uma fábrica e dois trailers que vendem lanches.
Como há poucas oportunidades de trabalho, muitos moradores acumulam funções. Marcia Luciane Silva dos Santos trabalha como auxiliar de serviços diversos no posto de saúde de Borá, tem um trailer para venda de lanches e é candidata à vereadora pelo PTB. O marido dela também acumula funções. Ele a ajuda no trailer e conserta carros em uma oficina da cidade, o que rendeu o nome que está usando na candidatura a vereador pelo PSB: Paulo Mecânico.
Cristiane Cazarin trabalha como analista de cargos e salários na usina e também é candidata à vereadora pelo PV. Questionada se a busca por exercer mais de uma função pode limitar ainda mais a quantidade de oportunidades que há na cidade, ela diz que não, porque a usina gera muitos postos de trabalho. Ela afirma ainda que conseguirá conciliar os dois trabalhos caso seja eleita.
O diretor administrativo da Usina Ibéria, Marcelo Toledo, conta que além de haver poucos moradores em Borá, há falta de mão de obra qualificada para trabalhar na empresa. “Nosso desejo é contarmos cada vez mais com colaboradores de Borá. No entanto, a falta de qualificação faz com que muitos dos nossos funcionários sejam de cidades vizinhas”, lamenta.