domingo, 12 de maio de 2013
Dilma Afif, Maduro… Agora estão todos juntos. Contra quem estão mesmo lutando?
Dilma não precisou nem trocar de uniforme. Com o mesmo casaquinho, a Dama de Vermelho recebeu o beija-mão de Guilherme Afif Domingos, agora ministro da Micro e Pequena Empresa — e também vice-governador de São Paulo… —, e Nicolás Maduro, ditador eleito (?!) da Venezuela, cujo governo, que mal começou, já tem ao menos oito cadáveres nas costas. São retratos do Brasil. São também retratos da América Latina.
Nas duas narrativas, a gente nota que os protagonistas resolveram exercer exemplarmente seu papel. Afif, que sempre se quis um “liberal”, nunca foi muito simpático nem mesmo ao governo FHC. Posicionou-se sempre à sua direita e chegou a ser, vá lá, um protótipo ao menos de um democrata conservador. A impressão que se tem é que suas reservas à era tucana tinham um caráter, quem sabe?, mais pessoal do que propriamente ideológico. Talvez nunca lhe tenham dado a atenção de que se julgava merecedor. O petismo não tem dessas frescuras: sabe recompensar quem, afinal de contas, beija a mão.
É evidente que o simbolismo da foto é mais forte do que seu conteúdo referencial. Se é até de se esperar que um homem de formação conservadora, caminhando para os 70 anos, beije a mão de uma senhora respeitável, não há como ignorar que o gesto encerra, se as ideias fossem levadas a sério — e se as pessoas se levassem a sério —, uma espécie de rendição. Por que Afif, afinal de contas, se tornou ministro do governo Dilma? Em que o petismo é expressão das teses que defendeu ao longo de quase 40 anos de vida pública? Na entrevista concedida à VEJA.com, ele não conseguiu ir além das metáforas fisiológicas: é preciso pensar com a cabeça, ensinou, não com o fígado. Ocorre que ele também é vice de um governador do PSDB. Nesse caso, não está claro se ele está pondo a cabeça a serviço do fígado ou o fígado a serviço da cabeça. Abaixo, vejam depois se quiserem, há um vídeo de pouco menos de 8 minutos, em que Afif, em entrevista ao site Mídia Sem Máscara, nos explica o que é o liberalismo. Foi concedida em 2006. Sete anos depois, ele foi beijar a mão de Dilma. E não tenho dúvida de que ele julga que seu liberalismo segue imaculado.
Maduro:
É evidente que eu não estou aqui a defender que Dilma Rousseff recusasse a visita do ditador Nicolás Maduro. Ainda que ela tivesse ligações históricas com a democracia, o homem, em princípio, é um problema dos venezuelanos. O Brasil mantém relações diplomáticas com a Venezuela, e esse tipo de acontecimento é parte do jogo. Mas também é certo que há modos e modos de cumprir o papel institucional.
Maduro não pegou Dilma de surpresa com o seu “presente”. Essas coisas são meticulosamente organizadas por assessores. Ao receber publicamente o retrato de Chávez, a presidente vai muito além do papel protocolar. Não está tendo com o presidente venezuelano a delicadeza de rigor. Presta, isto sim, uma reverência à ditadura, que matou há dias oito pessoas nos protestos de rua. Todos sabemos, de resto, em que condições se disputam eleições no país: a oposição não tem acesso aos meios de comunicação, hoje monopólio estatal. Mesmo assim, Maduro venceu com uma diferença de 1,49 ponto percentual, num processo escandalosamente fraudado, com milícias nas ruas e nos postos de votação intimidando os eleitores. Se receber Maduro era inevitável, ter um pouco de decoro era indispensável.
Mas não teve nenhum! Cumpre lembrar que Dilma e Cristina Kirchner deram um golpe no Mercosul e suspenderam o Paraguai para facilitar e entrada da Venezuela no bloco. A Venezuela é pioneira nas chamadas neoditaduras latino-americanas, que recorrem a eleições para desfigurar o próprio processo democrático.
De volta a Afif:
E volto, então, a Afif. Na Venezuela, o agora ministro certamente não estaria com Henrique Capriles, o líder da oposição. Isso seria, quero crer, “pensar com o fígado”. Segundo o entendimento político deste “liberal”, melhor negócio seria “pensar com a cabeça” e se juntar a Maduro mesmo, apresentando-lhe projetos de interesse da sociedade…
Por Reinaldo Azevedo(FOTO)-VEJA