sábado, 15 de junho de 2013
Ministro critica preços da Copa, novo Maracanã e detona saída de Neymar
Aldo Rebelo está com pressa. Atrasado para a entrevista ao UOL, o Ministro do Esporte é avisado por seu estafe que só terá cerca de 30 minutos para atender a reportagem. Meia hora, porém, é suficiente para que o político faça críticas e revele o que não gostou na organização da Copa das Confederações.
Com posições firmes, Aldo reclamou do preço de alimentos e bebidas nos estádios, criticou a elitização nas modernas arenas construídas para o torneio e admitiu que não gostou do Maracanã após a reforma.
Como apaixonado por futebol, ele ainda comentou o momento da seleção brasileira e aproveitou para detonar a transferência do maior craque do time de Felipão para a Europa. Segundo Rebelo, é um absurdo tratar Neymar como mercadoria e vendê-lo ao Barcelona, da Espanha.
O ministro do Esporte ainda fez uma breve avaliação sobre os preparativos para a Copa das Confederações e as recentes polêmicas sobre a retirada de ingressos para os jogos. Aldo só calou quando perguntado sobre a polêmica declaração do secretário-geral da Fifa, Jerôme Valcke, que disse aceitar um chute no traseiro em caso de problemas com a venda das entradas para as partidas da Copa do Mundo de 2014.
Confira a entrevista completa do ministro ao UOL:
UOL Esporte: Como o senhor avalia a preparação do Brasil para a Copa das Confederações?
Aldo Rebelo: A Copa exige em primeiro lugar os equipamentos esportivos, os estádios. Eles foram entregues, com algum atraso. Era para todos terem sido entregues em dezembro e só dois foram: Fortaleza e Belo Horizonte. Mas os demais passaram por eventos e jogos para testar o conforto, segurança, parte elétrica, hidráulica, etc. Então, eu acho que os estádios foram entregues a contento. É um desafio superado. Nós conseguimos também resolver a questão da tecnologia para as telecomunicações. A segurança também foi resolvida. Mobilidade urbana é mais um projeto para 2014. Então eu acho que a Copa das Confederações está bem resolvida.
UOL: A Matriz de Responsabilidades da Copa [lista de projetos relacionados ao evento], inicialmente, previa que a maior parte dos projetos de mobilidades estivesse pronta já para a Copa das Confederações. Por que agora eles são previstos só para o Mundial?
AR: Primeiro, é importante destacar que a Matriz de Responsabilidades não está nos encargos assinados com a Fifa. Não é uma exigência para a Copa do Mundo. A Matriz de Responsabilidades é um compromisso do governo federal com as cidades-sedes e os governos estaduais para antecipar obras do PAC, obras já previstas. Várias obras foram antecipadas e introduzidas na Matriz de Responsabilidades, algumas com prazo para 2013 e a maioria para 2014. Evidentemente, como no caso dos estádios, as obras para 2013 tiveram um prazo muito apertado. Muitas delas foram transformadas em obras para 2014 porque nós só temos uma exigência maior da mobilidades urbana na Copa do Mundo. A Copa das Confederações pouco altera a exigência da estrutura urbana e aeroportuária.
UOL: Ministro, nos últimos dias da preparação para a Copa das Confederações, foram divulgados os preços de alimentos e bebidas nos estádios. A água custará R$ 6, a cerveja R$ 12 e o cachorro-quente R$ 8. O que o senhor acha dos preços?
AR: Está caro. Não só nos estádios, mas também nos aeroportos. Isso tem relação com o custo que os concessionários pagam para usar as instalações. Isso acaba sendo repassado ao consumidor. Eu acho que isso é um a questão que nós temos que resolver. No caso dos aeroportos, o governo já procura a concessão de espaço em que haja preços mais acessíveis. De todo jeito, precisamos examinar a questão porque não temos só a Copa das Confederações e a Copa do Mundo. Nos estádios, temos um calendário esportivo e é preciso compatibilizar os preços com a capacidade de pagamento do nosso torcedor.
UOL: Especificamente nos estádios da Copa das Confederações e Copa do Mundo, o governo pode fazer alguma coisa?
AR: Eu preciso primeiro ter um levantamento completo dos preços em todos os estádios para ver se há uma universalização desses preços, ou seja, ver se também não há preços diferentes dependendo dos locais dos estádios. Vamos fazer uma pesquisa e depois conversar com os organizadores.
UOL: O senhor chegou a falar em "tolerância zero" com abuso de preços. O preço nos estádios entra nisso?
AR: Quando falei em abusos, me referi ao preço das diárias em hotéis para a Copa do Mundo. Uma parte dos preços é tabelada pela própria Fifa. A outra parte é do livre arbítrio do setor hoteleiro. Nós já tínhamos localizado na realização da Rio+20 práticas abusivas do setor hoteleiro. O governo fiscalizou. Havendo essa prática na organização dos eventos esportivos, o governo tomará as providências.
UOL: Como o senhor tem acompanhado as reclamações sobre os ingressos da Copa das Confederações. A retirada está funcionando?
AR: Acho que está. O número de reclamações reduziu bastante. Isso está se dando de forma bastante razoável.
UOL: Pessoas de fora das cidades-sedes reclamam pois só podem retirar o ingresso nas capitais que receberão jogos. A falta de postos em outras cidades é um erro?
AR: Esse é um problema que de fato existe. Como provavelmente há um número grande de ingressos comprados fora das cidades-sedes, você impedir que o comprador possa retirar o seu ingresso no local onde ele mora antes do evento é um problema que precisa ser solucionado. Ou estende o prazo para aqueles que moram fora das cidades-sede ou abre o espaço para que eles possam retirar o ingresso.
UOL: O secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, reconheceu os problemas e prometeu melhoras. Em tom de brincadeira, ele disse que, se o sistema de venda de ingressos da Copa do Mundo não funcionar, ele "aceita um chute no traseiro". O senhor se habilita para o chute?
UOL: Os estádios da Copa do Mundo, após sua reforma para o torneio, aumentaram o preço de seus ingressos. Isso ficará assim? O governo pode fazer algo a respeito?
AR: O governo deve fazer alguma coisa. O Esporte é um interesse público. Esporte é lazer, diversão é uma paixão nacional no caso do futebol. Ele faz parte da nossa cultura. Eu não posso ficar indiferente ao risco de elitização do futebol, do acesso aos jogos do futebol brasileiro. Como fazer isso? É natural que nós procuremos uma solução junto com os clubes, com as associações, com as entidades e com a CBF. Mas o governo tem que monitorar muito bem a possibilidade de elitização de um esporte que é essencialmente popular. Você deixar a parte mais pobre da população de fora dos estádios por causa do preço dos ingressos seria algo intolerável. Há soluções que foram buscadas em países como a Alemanha, por exemplo. Há a prática do subsídio cruzado. Ou seja, os ingressos mais caros subsidiam os mais baratos. Eu acho que é possível.
UOL: Muitas pessoas entendem que as novas arenas não são mais "estádio do povão". O que o senhor acha? Gostou do novo Maracanã?
AR: Eu gostava mais do antigo. Eu achava o outro Maracanã mais interessante. Gostava daquele estádio com bandeiras, com geral, com aquele clima de festa. Passamos por um processo de elitização do comportamento e do público. O povão foi afastado, infelizmente. Isso não é uma coisa boa para o espetáculo do futebol. Há argumentos sobre segurança e temos que aceitar, mas acho que aquele público da geral não foi para as novas arquibancadas. Eles ficaram fora dos novos estádios.
UOL: O dinheiro público financiou essas reformas, como a do Maracanã. Será que o governo errou então?
AR: Creio que não. Até porque não estou reclamando da construção dos estádios, mas sim da composição do público. Nós vamos procurar fazer com que o público dos antigos estádios volte a ter acesso aos novos. Não sou completamente saudosista. Entendo que hoje tem mais conforto, mais higiene, melhor acesso e mais produtos. É claro que as coisas melhoraram bastante. Mas isso poderia ter sido melhorado e, ao mesmo tempo, ter preservado o espírito popular de um estádio de futebol.
MINISTRO ACREDITA NA SELEÇÃO, MAS CRITICA SAÍDA DE NEYMAR
UOL: Falando um pouco de futebol, o que o senhor está achando da seleção brasileira?
AR: Eu estou otimistas, e sempre sou assim com o nosso time. Os defensores se destacam nos clubes onde jogam, temos grandes zagueiros e alas. Daniel Alves, Marcelo, David Luiz e Thiago Silva são excelentes. Temos também volantes que jogam com facilidade. O Corinthians teve um grande desempenho por conta desses jogadores, e um deles está na seleção [Paulinho]. Temos ainda grandes atacantes. Qual o time do mundo se dá ao luxo de ter dois grandes jogadores como Neymar e Lucas? Os dois jogando pelo lado do campo, com muita habilidade, vão nos ajudar muito. Se houver uma evolução técnica e tática, da troca de passes e do conjunto, temos todas as condições para chegar em 2014 como uma seleção favorita.
UOL: E o que você achou dessa transferência do Neymar para o Barcelona?
AR: Eu sou completamente contra. Isso é um absurdo. É tratar o jogador como commoditie e o clube como botequim. Querem apenas exportar e lucrar. Essas coisas não podem existir. Lembro que minha mãe certa vez cantou uma música da década de 60, e eu perguntei o que era aquilo. Ela me explicou que era uma canção para pedir que o Pelé não deixasse o futebol brasileiro. Isso que é bacana. Houve uma campanha contra a ida daqueles craques. Lembro até que Nelson Rodrigues escreveu uma crônica disso. Eles não têm que ter esse preço. Compreendo, mas não sou a favor. E tecnicamente, lembro que uma vez o Ronaldo Fenômeno contou que aprendeu muita coisa na Europa, menos a marcar. Ou seja, será que o Neymar vai evoluir tanto? Não sei.
UOL: Mas o senhor não acha que a evolução do cenário brasileiro no cenário econômico internacional do futebol não passa por essas grandes transferências? Não é bom para os clubes, que podem ter receitas para investir em estrutura e novos jogadores?
AR: Eu acho que não. Por exemplo, tivemos um grande escultor no século XVIII chamado Aleijadinho. Recentemente, teve uma exposição dele na França e o chamaram de Michelângelo do Barroco. Por que isso? Porque ele ficou no Brasil na época e fez grandes trabalhos. Se ele tivesse ido para Itália ou França, essas obras seria francesas ou italianas. Isso mostra que precisamos levar a obra e não o artista. Os artistas devem ficar no Brasil. Devemos fazer um esforço para que os jogadores fiquem no Brasil e todos no mundo inteiro queiram ver os nossos times, assim como acontecia com o Santos da década de 60, o Palmeiras de 70 e tantos outros.
UOL: O Governo tentou várias medidas para evitar a elitização dos estádios durante a Copa do Mundo. Pediu ingressos a preços populares, brigou por entradas para beneficiários do Bolsa-Família. Mesmo assim, um número pequeno de populares adquiriu ingresso em 2013. O senhor espera que este número aumente para até 2014?
AR: E alguém esperava que o pessoal do Bolsa-Família ia comprar ingresso? Eu alertei a Fifa que precisávamos encontrar uma solução. Esta medida foi apenas parcial, com distribuição a esse programa e às populações indígenas do Mato Grosso e de Amazonas para a Copa de 2014. Os ingressos populares não foram completamente divididos na categoria 4 [a mais barata]. Beneficiaram estudantes e pessoas de terceira idade, mas não foi uma coisa completa.
UOL: No início da preparação para a Copa, havia a promessa de que os estádios fossem bancados com dinheiro da iniciativa privada. Te decepciona chegar agora e ver que grande parte da verba vem de investimento público?
AR: O governo federal não fez doação, apenas emprestou dinheiro do BNDES com as mesmas garantias exigidas no mercado para qualquer empresa. Deste jeito, só temos verba pública na Copa do Mundo em obras de infraestrutura, que serão utilizadas pelo povo depois.
UOL: A maioria do dinheiro investido em estádios é dos cofres estaduais.
AR: Algumas são parcerias público-privada, como em Natal. No caso de Pernambuco, é um acordo com uma construtora, que recebeu uma área para fazer o estádio e outras instalações. Os estádios vão se remunerar. Salvador, por exemplo, já vendeu os naming rights.O Brasil já mostrou que é capaz de viabilizar os estádios. O problema não está aí. O problema está em tornar o futebol e os clubes brasileiros viáveis economicamente. Temos que aumentar a participação do Brasil no PIB do futebol mundial. Esse valor ainda é muito pequeno. Temos que valorizar as marcas das nossas competições.
UOL: Recentemente, o secretário Jerôme Valcke disse que a divisão dos poderes do Brasil em três esferas prejudicava a organização da Copa por conta dos diferentes interesses de poderes Federal, Estadual e Municipal. De fato, a organização foi comprometida por isso?
AR: Nada disso, de maneira nenhuma. A democracia tem suas vantagens. Por conta de todos estes poderes, tivemos uma fiscalização eficiente de tudo que foi feito para a Copa. Isso é uma estrutura que funciona, com órgãos de controle eficientes. Quando não se tem democracia, você depende de outras estruturas. De uma certa visão, elas podem funcionar melhor, mas não tem a mesma segurança e a mesma fiscalização. Em um país como o Brasil, isso não funcionaria. Temos um país grande, e cada Estado precisa tomar sua decisão.
UOL: Cidades estão passando por protestos. Isso pode atrapalhar a Copa das Confederações? A Polícia está preparada para lidar com isso?
AR: Não vejo problemas. Um país democrático convive tranquilamente com isso. Basta que os manifestantes saibam de suas responsabilidades e a polícia lembre do seu serviço. Todo excesso, claro, será coibido. Os manifestantes que causarem a desordem serão reprimidos, enquanto teremos instrumentos democráticos que podem prevenir qualquer tipo de abuso do aparelho repressivo [Polícia].
UOL: A Copa em 2014 será realizada num período pré-eleitoral. O senhor acha que os resultados da organização e da seleção podem influenciar as eleições?
AR: Acho que não. Se tivermos problemas sérios, o que não acredito que vá acontecer, poderíamos ter alguma influência. Mas como vai sair tudo bem. Todos acharão que fizemos nossa que obrigação. Não vejo nenhuma influência.