sexta-feira, 19 de julho de 2013
França Teixeira:o homem que contratou Pelé para o Bahia
A Bahia esportiva engasgou com o almoço naquele dia. O radialista França Teixeira, que morreu ontem aos 69 anos, abriu o programa com uma bomba. O ano era 1971 e o Bahia estava contratando Pelé. O próprio “Negão”, assim o Brasil chamava o Rei, confirmava no ar. Como bem assinalou o colega Hailton Andrade, era como se hoje o principal programa de esportes na TV anunciasse a chegada de Messi para fazer dupla com Fernandão no tricolor. Tudo armação.
“E o negão disse que tava já mantendo as negociações com Osório (Vilas Boas, ex-presidente do Bahia). A gente armou tudo com ele”, confessou Teixeira. “Foi uma brincadeira que fizemos, porque eu estava sempre na Bahia nessa época”, lembrou o próprio Pelé. Mais difícil que o Bahia contratar Pelé, dizem os mais antigos, era encontrar um aparelho de rádio na cidade que, na Resenha do Meio-Dia, não estivesse sintonizada nos quilohertz da Rádio Cultura da Bahia.
Da rua, a partir das janelas dos casarões e prédios sem garagem, na Salvador do final dos anos 60 e início de 70, era possível ouvir quase em eco o vozeirão com o seu mais célebre bordão: “É ferro na boneca, minha cara e nobre família baiana”, largava França, cheio de gosto, antes de falar de esporte e depois de colocar o Hino ao Senhor do Bonfim. Nos casos que marcaram sua carreira, muita polêmica e, principalmente, irreverência.
Que o diga o ex-técnico do Bahia, Paulo Amaral, vítima do mais folclórico alterego criado por Teixeira. Em uma das resenhas, Zé Veneno, com toda sua acidez e bom-humor, danou-se a falar mal do treinador, tendo como pano de fundo a gravação de um cavalo a relinchar. Antes do fim do programa, Amaral invadiu a emissora, então no bairro da Graça, disposto a fazer “Zé Veneno” engolir o que disse. França precisou apenas de um largo sorriso para tudo ficar por isso mesmo.
O fato é relatado em entrevista que o radialista concedeu em 2009 ao repórter Nelson Rocha, da Tribuna da Bahia. Aliás, avesso a entrevistas, França ultimamente se dispôs a conversar com poucos colegas de profissão. Sorte de quem conseguiu, como Nelson e Hailton.
Para produzir a matéria, em 2011, Hailton foi ao prédio do Tribunal de Contas do Estado (TCE), no Centro Administrativo da Bahia (CAB), onde França trabalhou como conselheiro até meses atrás. Bastou alguns minutos para o repórter perceber que aquela não era a grande área em que seu entrevistado gostava de atuar.
“No meio desse ambiente um tanto sem graça e de ausência de cores vivas, um dos sete conselheiros do TCE destoa: Antônio França Teixeira”, escreveu. Mas, nem no TCE abandonou sua aparência de personagem do futebol e do rádio, que largou ainda nos anos 80. Como conselheiro, relatam algumas pessoas, lia os processos no plenário com a entonação de quem estava irradiando um jogo.
Apesar disso, não parecia nem um pouco empolgado com futebol. Agora mesmo, na antevéspera do Ba-Vi Série A, não estaria nem aí para o clássico. Quando muito, exaltava o seu Ypiranga, que “não ganha, não perde, e nem empata, porque não entra em campo”. Controverso, há também quem fale mal de França Teixeira. Lembram de processos que sofreu, questionam seus escrúpulos, seu caráter.
Há um caso marcante. Durante semanas antes da reinauguração da Fonte Nova, também em 71, França teria questionado com veemência a qualidade do projeto. Colocou em cheque a obra, construída “a toque de caixa”. O suficiente para criar o clima de tensão que resultou na tragédia com mortos e feridos, sem que qualquer problema estrutural ocorresse. França não falava sobre o assunto com ninguém. Queria que ficasse para a história o dia que “contratou” Pelé e que chamou o técnico do Bahia de quadrúpede. Queria que ficasse para a história o “ferro na boneca”. E conseguiu.FONTE:CORREIO DA BAHIA.