De um lado grandes camarotes que chegam a custar R$ 1800. De outro, blocos com valores que chegam a R$ 1500 por abadá. Entre eles, trabalham, quase invisíveis para boa parte dos que curtem o Carnaval de Salvador, os famosos cordeiros – homens e mulheres que seguram as cordas que separam foliões pagantes da pipoca.
Por dia, cada uma dessas pessoas ganha R$ 45, além de biscoitos e água, para fazer um percurso de cerca de quatro horas enfrentando chuva, sol e os comuns empurra-empurras durante o circuito.
Cátia Sueli tem 34 anos, quatro filhos e está desempregada. Ela vai trabalhar por seis dias como cordeira e receberá R$ 270. "Preciso muito desse dinheiro. Vou conseguir alimentar meus filhos. Trabalho honestamente, por isso estou aqui", disse à reportagem do UOL. Moradora do bairro de Santa Cruz, ela leva em torno de uma hora para chegar ao Circuito Dodô (Barra).
Segundo a cordeira, "essa vida é humilhante" já que ela chegou a passar fome no Circuito. "A gente chega aqui cedo sem almoçar e eles nos dão biscoitos, o que não nos alimenta. E nós não temos dinheiro para comprar comida quando saímos daqui", lamentou.
Carlos Augusto, por sua vez, tem 37 anos e é cordeiro há 15. Sem emprego, ele conta que já chegou a apanhar de policiais dentro do percurso. "Os foliões empurram e fazem zona. O policial nunca vai achar que foram eles e sentam o cassetete em nós", contou ele.
O UOL presenciou o desrespeito a esses cordeiros dentro do trio. Muitos foliões os empurram, agridem e até negam alguns pedidos de água. Pelas ruas, muitos deles dormem no chão à espera do outro dia de trabalho.
Esse é o caso do casal Thais Oliveira e Samuel Nascimento, que dorme em uma barraca no bairro da Barra. "Não vale a pena nada disso. É muito desgastante. Arriscamos a nossas vidas por mixaria. Mas precisamos comer e alimentar nossa filha", disse a cordeira.
De acordo com a Prefeitura de Salvador, a responsabilidade por esses cordeiros é do bloco carnavalesco. No entanto, o órgão estabelece normas para que essas pessoas tenham qualidade de vida no trabalho.
"Eles precisam fornecer equipamentos como luvas, camisetas e bonés. Além de protetor solar", disse a assessoria de imprensa da prefeitura. No entanto, somente dois de 15 entrevistados pela reportagem receberam protetor solar.