Ainda em sua fase inicial, a Operação Lava Jato da Polícia Federal apresentou ao país o até então desconhecido deputado federal Luiz Argôlo, da Bahia, um parlamentar de primeiro mandato que acabara de filiar-se ao recém-criado Solidariedade. À época, Argôlo, de 34 anos, passava desapercebido pelos corredores da Câmara. As investigações revelaram que, de fato, pouco se sabia sobre ele: o congressista era um dos políticos mais próximos do doleiro Alberto Youssef, pivô do maior propinoduto que se tem notícia no Brasil. Segundo a PF, ele dedicava seu mandato a ajudar Youssef em suas investidas contra os cofres públicos. As descobertas deixaram o deputado baiano em maus lençóis e, não fosse o histórico coorporativismo dos colegas parlamentares e o calendário eleitoral, poderia ter deixado a Câmara pelos fundos – seu processo de cassação de mandato foi aprovado pelo Conselho de Ética da Casa, mas acabou o ano estacionado na Comissão de Constituição e Justiça. Nas últimas eleições, Argôlo tentou se reeleger, mas ficou na fila de suplentes.
Independentemente dos desdobramentos da Operação Lava Jato e do quanto Argolo estará enrolado com ela no futuro, algo que pode ser concluído sobre o jovem deputado é a dificuldade em separar o público do privado. Depois de ocupar as páginas policiais e enfrentar um processo de cassação, na última terça-feira ele contratou como secretário parlamentar em seu gabinete o empresário Ari Carlos Rocha Nascimento, que, no dia 2 de setembro do ano passado, prestou depoimento como sua testemunha de defesa no Conselho de Ética. Na ocasião, foi taxativo ao dizer que tinha “convicção pessoal” contra as denúncias que rondam Argôlo. Como a Câmara está em recesso e Argôlo não conseguiu um novo mandato, o assessor ganhará salário sem ter trabalhado efetivamente.
Não é a primeira vez que Ari Carlos trabalha para o deputado baiano: entre fevereiro de 2011 e dezembro de 2012, ele também foi nomeado por Argôlo e recebeu, por mês, 6.010 reais.
Os laços entre o parlamentar e o empresário não param aí. Ao longo do mandato, Argôlo repassou 114.000 da verba prevista para o seu gabinete da Câmara para a empresa Seculus Análise e Pesquisa de Opinião, cujo dono, João Carlos Oliveira Rocha, é filho de Ari Nascimento. O deputado fez pagamentos à empresa inclusive enquanto Ari estava lotado em seu gabinete – e sempre por meio da cota parlamentar, verba pública destinada a arcar com as despesas específicas do mandato. Somente entre setembro e outubro do ano passado, na reta final da campanha eleitoral, o instituto de pesquisa recebeu 70.000 reais do deputado. De acordo com a nota fiscal, o trabalho refere-se à realização de pesquisas sócio-econômicas nas regiões do litoral norte e sul, metropolitana e do agreste baiano. O site de VEJA solicitou à empresa o resultado da avaliação, mas não obteve resposta.
Embora esteja no nome de João Carlos, há evidências de que Ari colocou o filho como sócio para maquiar o vínculo com a empresa. “É o Ari que faz tudo. Como o conheço, ele ficava mandando mensagem para mim durante a campanha falando sobre suas pesquisas eleitorais. Ele também trabalhou com o Argôlo nas eleições, principalmente buscando votos no interior, onde ele é bastante conhecido”, diz um deputado baiano.
O próprio Ari não esconde seu vínculo com a empresa. Questionado pelo site de VEJA, por telefone, se era o responsável pela Seculus, afirmou: “Exato”. No entanto, após as perguntas sobre sua relação com Argôlo, mudou o discurso: “Eu não sou o dono da empresa. Eu sou um técnico da área e trabalho para a empresa. O dono é o João Carlos. Eu assino relatórios internos, mas não documentos oficiais. Eu não sou funcionário da empresa”, disse, numa resposta confusa.
Ari assina contratos e documentos como diretor financeiro da Seculus, conforme documentos anexados em comprovantes de serviço encaminhados à Câmara. No contato telefônico, o empresário disse que a empresa atende outros parlamentares e que o serviço não é ilegal, já que companhia não está em seu nome.
Ari estava lotado no gabinete do deputado Josias Gomes (PT-BA) até o dia 1º de janeiro deste ano, mas foi exonerado após Gomes assumir a Secretaria de Relações Institucionais do Governo da Bahia. O petista também pagou a Seculus com verba pública: 148.260 reais foram destinados à empresa entre abril de 2011 e outubro do ano passado.
Lava Jato – Ainda na primeira fase da Operação Lava Jato, Argôlo foi flagrado em estreita relação com Alberto Youssef: conforme interceptações da PF, ele trocou mais de mil mensagens com o doleiro em um período de seis meses e chegou a ganhar um helicóptero de presente do pivô do propinoduto. Em depoimento ao Conselho de Ética, a ex-contadora de Youssef, Meire Poza, confirmou que Argôlo mantinha contato com empresas que destinaram dinheiro para o esquema de lavagem e pagamento de propina. E disse que ele também era beneficiário do esquema fraudulento. Segundo ela, o pai de Argôlo, Manoelito, recebeu o dinheiro destinado a ele.
Apesar das provas contundentes de envolvimento no esquema de corrupção, ele não sofreu punição na Câmara dos Deputados. O Conselho de Ética pediu a cassação de Argôlo, mas ele recorreu à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde, com o apoio de aliados, o processo não avançou.
Argôlo recebeu mais de 63.000 votos nas eleições do ano passado. Diante do provável retorno à Câmara dos Deputados na próxima legislatura, já que é o primeiro suplente, o parlamentar busca melhorar a sua imagem perante a opinião pública. “O deputado me contratou para finalizar [o mandato]. Ele quer saber o que fazer para sair bem dessas coisas”, diz o empresário Ari Carlos. Argôlo, ainda segundo Ari, não deve assumir de imediato o mandato na Câmara caso alguma cadeira seja vaga até 2016. A ideia é pedir licença do cargo para, antes, "montar um centro de estudos para acompanhar o cenário eleitoral e avaliar qual é a melhor forma de voltar”.Fonte:Veja