O juiz federal Sergio Moro, responsável pelas ações penais da Operação Lava Jato, afirmou nesta segunda-feira que o Brasil "perdeu a sua dignidade", diante de um quadro de corrupção sistêmica escancarado pelo esquema bilionário de desvios de recursos que se instalou na Petrobras. "Perdemos a dignidade. Temos dificuldade de nos encarar a nós mesmos diante do espelho, perante a comunidade internacional, diante de um quadro de corrupção sistêmica", disse Moro no Exame Fórum 2015, promovido em São Paulo pela revista EXAME, da Editora Abril, que também publica VEJA.
Moro, que foi fortemente aplaudido por mais de uma vez, afirmou que, no caso da Lava Jato, mais "assustador" do que a corrupção em si - que segundo ele, sempre irá ocorrer - é a naturalização do pagamento de propina. Além dos custos diretos, como o reconhecimento dos desvios de 6 bilhões de reais na Petrobras, há custos indiretos, como a interferência de agentes públicos e privados no planejamento econômico. "O enfrentamento da corrupção sistêmica trará ganhos significativos a todos: às empresas, e à economia em geral. O custo da corrupção sistêmica é extraordinário", disse, citando o caso da refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, que deve causar um prejuízo de 2 bilhões de dólares à Petrobras.
O magistrado disse que a corrupção faz o país "andar pra trás". Para o juiz, os crimes de colarinho branco tiram a confiança de agentes do mercado na concorrência justa e dos cidadãos e das instituições privadas nas leis. "Afinal, estamos em um governo de leis ou em um governo de homens? A lei se aplica para todos ou não?, questionou.
Ao comentar a onda de protestos contra o governo federal no país, Moro disse que é preciso aproveitar o momento em que as pessoas deixam a condição de consumidores para se tornarem cidadãs. "Esse momento é muito raro. Apesar de o quadro econômico ser ruim há esperança - desde que não nos acomodemos", disse.
O juiz também contestou o argumento de advogados de defesa dos empreiteiros presos na Lava Jato e afirmou que as prisões decretadas ao longo da operação são um recurso sempre excepcional, porque a "regra é que o suspeito só pode ser punido depois de ser julgado". "O que eu entendo é que o que existe [na Lava Jato] são indícios de um quadro de corrupção sistêmica, e nesses casos há a necessidade de estancar a hemorragia dos cofres públicos. E os tribunais têm entendido dessa forma, o que me deixa em posição de maior conforto", afirmou.
Faxina - Moro disse que "não é contra acordos" para que as empresas possam voltar a ter contratos com o setor público, mas afirmou que eles precisam seguir regras e prever a colaboração das companhias. Segundo o juiz, as empreiteiras têm de se comprometer em acabar com a corrupção, a revelar todos os fatos pregressos e indenizar o poder público em toda sua extensão. Ele também cobrou que as empresas trocam os cargos de comando. "Não é possível seguir com acordos com os mesmos dirigentes que estavam quando houve corrupção. É preciso que a empresa faça uma faxina interna", disse.
Moro evitou comentar sobre as medidas que toma para manter sua segurança pessoal e sobre o medo de retaliações. O magistrado arrancou risos da plateia ao dizer que "por questões de segurança, não fala sobre segurança". Ele também disse que não se sente confortável em responder se a Lava Jato atingiria "o topo" do poder nacional.Fonte:Veja