Vamos dizer as coisas com todas as letras, ainda que possa sobrevir um tanto de desalento? A presidente Dilma Rousseff obteve uma expressiva vitória na madrugada desta quarta. E isso indica que o impeachment que parecia perto de atracar no cais descreveu uma curva considerável.
O governo percebeu que a disposição anteriormente anunciada de adiar a votação dos 32 vetos presidenciais passava um sinal óbvio de fraqueza. Resultado: o dólar voltou a disparar e atingiu a maior cotação na vigência do real. Melhor votar. E se mobilizou, então, uma força-tarefa, especialmente voltada para atrair peemedebistas, e, entre relevâncias e irrelevâncias, 26 dos 32 vetos presidenciais foram mantidos. A sessão foi encerrada antes que os outros fossem apreciados, dois deles bombas de alto poder explosivo: o reajuste dos funcionários do Judiciário e a extensão a todos os aposentados do índice que corrige o salário mínimo.
Sim, logram-se vitórias importantes. Conseguiu-se manter o veto à formula 85/95 para a aposentadoria como alternativa ao fator previdenciário. Dilma já enviou uma MP que propõe uma progressão nessa tabela de acordo com a expectativa de vida dos brasileiros. O Ministério do Planejamento diz que, se o veto tivesse caído, os gastos extras, até 2035, seriam de R$ 132 bilhões.
Outro veto mantido pelos parlamentares na madrugada desta quarta foi o à isenção de PIS-Cofins para o óleo diesel. Segundo o governo, o impacto dessa medida seria de R$ 13,9 bilhões em 2016 e de R$ 64,6 bilhões até 2019. Para lembrar: só se derruba um veto presidencial com a maioria absoluta da Câmara e do Senado, formada pela metade mais um do total de cada Casa: respectivamente, 254 deputados e 42 senadores.
O governo ainda não se livrou de todos os perigos, é claro!, mas deu um sinal de vida no fim da noite desta terça e madrugada desta quarta. A sessão foi encerrada antes que o veto ao reajuste do salário do funcionalismo do Judiciário — média de 59,5% em quatro anos — fosse votado. Também não se apreciou ainda o “não” de Dilma à extensão do índice de reajuste do mínimo a todos os aposentados.
Os dois temas são mais espinhosos porque se referem, vamos dizer, a dinheiro de curto prazo para categorias bastante mobilizadas. Uma nova sessão conjunta do Congresso terá de ser marcada, o que o governo espera que aconteça até o fim deste mês — o que me parece pouco provável.
Voto e reforma
Dilma mobilizou seus ministros e líderes do Congresso para tentar manter os vetos. Mas a coisa não parou por aí. A presidente da República entregou às respectivas bancadas federais do PMDB na Câmara e no Senado a indicação de cinco nomes para a reforma ministerial: cada uma das Casas indica dois, e ambas apontam o quinto.
Quais ministérios? O governo acena com a possibilidade de dar a Saúde ao partido. Também seria criado o Ministério da Infraestrutura, que juntaria Portos e Aviação Civil, que já estão com a legenda. Ainda estão em conversação a Integração Nacional ou o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. Minas e Energia e Agricultura continuam com os peemedebistas Eduardo Braga e Kátia Abreu, respectivamente, mas há quem considere, no PMDB, que eles pertencem à cota pessoal de Dilma. Os peemedebistas reivindicam também a Educação.
A petista havia oferecido ao vice, Michel Temer, e aos presidentes da Câmara e do Senado, Eduardo Cunha e Renan Calheiros, respectivamente, a chance de indicar nomes. Eles declinaram. Depois de muita conversação, os parlamentares podem fazer agora a escolha. Leonardo Picciani (RJ), líder da bancada na Câmara, informou na noite desta terça à presidente a decisão do PMDB da Casa de integrar a nova equipe.
Sim, meus caros, hoje, os sucessos e insucessos do governo são pensados segundo o impeachment. São necessários 342 votos para que a Câmara admita a denúncia, o que implicaria o afastamento de Dilma. Os que pretendiam derrubar os vetos presidenciais não conseguiram os 254 necessários, que já são 88 a menos.
Querem um consolo? Lula pode estar ainda mais chateado do que vocês. A cada dia que Dilma fica no Palácio, é a reputação dele que vai sendo corroída. Não que devamos, por essa razão, torcer pela permanência. Até porque o Brasil pode não suportar.
Muita coisa vem por aí. Dilma enviou a MP da CPMF para o Congresso. Se o imposto for rejeitado, a possibilidade do impeachment volta a crescer. As coisas estão assim mesmo: na corda bamba.
Por Reinaldo Azevedo(Veja)