O presidente do PSDB, senado Aécio Neves (MG), concede uma entrevista à Folha desta segunda e faz afirmações que me parecem inquestionáveis. Uma delas, no entanto, merece algumas ponderações — até porque, verão os leitores deste blog, ela remete a questões já tratadas aqui, com opinião clara emitida por este escrevinhador. Vamos ver.
Diz Aécio sobre o governo:
“O governo da presidente Dilma acabou. Essa é a constatação. E acabou de forma trágica, fez o Brasil retroceder 20 anos nas conquistas econômicas, na credibilidade e também nas conquistas sociais, na vida das pessoas. Vamos ter um desemprego de mais de 10% e a inflação acima de 10%.”
Bem, como negar. Acho, igualmente, que o governo não consegue se recuperar, mormente quando fica claro, dada a substituição no Ministério da Fazenda, que vêm por aí mais algumas das feitiçarias que nos conduziram ao desastre.
Aécio observa, e está obviamente certo, que Dilma, inquestionavelmente, cometeu crimes de responsabilidade. Deixa claro também que Eduardo Cunha, hoje, se tornou mais um empecilho do que uma solução em matéria de impeachment e chama de “vitória de Pirro” o resultado do julgamento no STF. Observa, o que também é correto, que o discurso que o PT fazia sobre o impeachment ser golpe foi desmoralizado. A menos que se ache que uma corte suprema estabelece um rito para golpes…
A ponderação
E onde cabe a ponderação? Indagado sobre a eventual participação do PSDB num governo Temer, Aécio responde:
“Apoiamos o impeachment porque estamos convencidos de que a presidente cometeu crimes que o justificam, mas, acontecendo o afastamento e assumindo o vice, passa a ser dele a responsabilidade de propor um novo projeto. A posição da maioria do partido e a minha é de que não devemos nem sequer pensar em cargos. Não nos negaremos a ajudar o Brasil naquilo que for essencial, mas será muito mais confortável fazermos isso por meio de uma agenda, sem pensar em participar de um governo que não sabemos de que forma se colocará.”
Ok. Não acho que se deva colocar a participação no governo como precondição. É claro que é preciso saber o que vai querer Michel Temer caso assuma a Presidência. Aécio segue:
“O método será o que vigorou na última década, do qual o PMDB foi parceiro? Da distribuição de nacos do poder sem qualquer critério? Não falo de um passado remoto, falo de meses atrás. Com a participação do PMDB, a máquina pública vem sendo degradada, ocupada, assaltada por membros de várias forças partidárias. O PSDB não pode perder a referência que tem hoje e não colocará a sua determinação de construir um novo modelo de país para ocupar cargos. Isso não significa que vamos virar as costas para um eventual governo do vice.”
Ótimo! Virar as costas não pode mesmo. Um anúncio dessa natureza tenderia a inviabilizar o impeachment porque aumentaria enormemente o temor dos agentes políticos e econômicos de que Temer tivesse dificuldade para pacificar o Congresso.
Aécio diz mais:
“O presidente Michel é um homem de bem, cordato, afeito ao entendimento. Mas, até aqui, ele foi um instrumento desse governo que acabou com o Brasil. Ele foi um parceiro permanente e ativo da gestão que fez o Brasil retroceder 20 anos.”
O PMDB é parceiro? É, sim! Vejam lá algumas figuras de proa enroladas na Lava Jato, por exemplo. Deu as cartas? Aí se sabe que não. Para contrabalançar, não custa lembrar que Temer foi parceiro também do governo FHC, muito especialmente no tempo em que comandou a Câmara dos Deputados. Foi praticamente o líder da ala peemedebista que apoiou a reeleição do tucano em 1998. Lembro isso só para alargar um pouco a biografia do vice à luz da história.
O PSDB tomou a decisão correta quando decidiu integrar o governo Itamar Franco, com a deposição de Collor. É a pré-história do Plano Real, que tirou o país do buraco. Sim, Temer não é Itamar — que, à época, nem partido tinha. De fato, não participava do governo Collor. Era só uma personagem acidental e incidental. Já o partido presidido por Temer é o maior do país.
Ter ou não cargo no governo é, sei disto, coisa diferente de garantir a governabilidade e apostar na estabilidade. E isso, parece-me, Aécio assegura, no que lhe disser respeito, caso haja o impeachment.
Uma coisa o PSDB não pode fazer — e acho que a entrevista de Aécio deixa claro que não faria ou não fará: colaborar para que se cumpra a lei, com a deposição da presidente, e, depois, dizer ao futuro governante: “Vire-se”. O PT agiu desse modo em 1992: praticamente liderou a deposição nas ruas e depois anunciou: “Governabilidade não é problema meu”. Tanto que o então deputado Jaques Wagner, hoje ministro da Casa Civil, teve a cara de pau de pedir o impeachment de Itamar.
E por que o PT fez aquela escolha? Porque achava que a eleição de 1994 já estava no papo. Perdeu para o PSDB, que entrara no governo, no primeiro turno. Perdeu de novo para os tucanos em 1998, também no primeiro turno.
Ao se recusar a participar do governo em 1992, o PT fez a coisa errada para si mesmo e a coisa certa para o Brasil. Na hipótese do impeachment de Dilma, sugiro que o PSDB considere a hipótese de um duplo acerto. E isso, claro!, segundo um programa.Fonte:Reinaldo Azevedo