A confusa administração de Brasília, a cargo do governador Rodrigo Rollemberg, do PSB — e refiro-me a desencontros em várias áreas, dos quais me dispenso de falar agora; fica para outras oportunidades —, decidiu erguer um muro em Brasília, na Esplanada dos Ministérios, para separar, com placas de metal de dois metros altura, defensores e opositores do impeachment. Desde logo, note-se que a escolha está errada: na matemática, na simbologia e no fato.
Erra no fato a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal. Melhor seria ter destinado áreas distintas da enorme Praça dos Três Poderes para os manifestantes de ambos os lados, não alimentando o que eu chamaria de “A Arquitetura do Confronto”. Não se trata de uma guerra, mas do exercício do Estado de Direito.
Erra na simbologia quando faz crer que o que estarão em disputa no próximo domingo expressam visões igualmente legítimas. Essa, no fim das contas, é a maior de todas as falácias. No dia 17, os que defendem o triunfo do Artigo 85 da Constituição e da Lei 1.079, que o disciplina, hão de enfrentar aqueles que querem rasgar diplomas legais que são pilares do regime democrático.
E erra na matemática o governo do Distrito Federal quando faz supor que a sociedade brasileira está dividida, em partes iguais, sobre o impeachment da senhora Dilma Rousseff. Não! De um lado, estão quase dois terços da sociedade brasileira, querendo que Dilma apeie ou seja apeada do poder; do outro, menos de um terço, que defende a sua continuidade.
A burocracia do governo do Distrito Federal resolveu igualar os desiguais. E sempre que isso acontece é a virtude que se vê obrigada a ceder à indignidade do vício, não o vício às qualidades da virtude.
O “Muro da Vergonha” entrará para a história como o único legado do PT, que, infelizmente, ainda vai durar muito tempo, como uma ferida a incomodar os brasileiros. Mas um dia será uma cicatriz, da qual se tem uma triste memória, junto com a satisfação decorrente do fim da dor.
Lula e o PT separaram o Brasil entre “nós” e “eles”, de sorte, como já escrevi aqui, que o “eles” éramos nós, pessoas que o partido e seu demiurgo consideravam desprezíveis, e “nós” eram eles, os indivíduos de moral supostamente superior, acima das vicissitudes humanas, ocupados apenas em fazer o bem comum.
Erguidos os panos da República, expuseram-se — e estamos longe de saber tudo — os horrores de uma máquina organizada para assaltar o estado brasileiro. A realidade se revelou sem véus: “nós” éramos nós mesmos, os assaltados, os espoliados, os enganados, os humilhados pelo maior esquema de corrupção da história, tome-se qualquer país como exemplo. E “eles” eram eles na sua pureza criminosa.
Muro de Berlim
Um amigo me ligou no domingo à noite afirmando que parte da imprensa — a de esquerda, oram vejam! — estava se referindo de maneira pejorativa às placas de metal, chamando-as de “Muro de Berlim”. Esquerdistas dos dias que correm não estudam. Informam-se e deformam-se só pelas redes sociais. Não usam a Internet nem para baixar livros. Contentam-se com o que outros tão ignorantes como eles próprios expelem por aí.
Alguém mais informado deve ter dado o alerta, e a metáfora foi enfiada no saco. Mas eu a recupero. Trata-se, sim, do nosso Muro de Berlim — erguido, o original, pelo regime comunista da Alemanha Oriental no dia 13 de agosto de 1961, separando, então, a Berlim Oriental, comunista, da Berlim Ocidental, capitalista. O muro só caiu em 1989, com a derrocada da União Soviética e dos regimes comunistas do Leste Europeu.
Durante 28 anos, o muro se tornou o símbolo de um mundo falsamente dividido em duas moralidades, ambas supostamente legítimas e assentadas em justas aspirações humanas. Uma ova! No mundo comunista estavam a ditatura, o terror, o atraso, a violência, a destruição da individualidade, o esmagamento dos direitos.
Do outro lado, assentavam-se as chances de uma vida digna — o que nunca quis dizer que todos os países capitalistas tivessem ou tenham oferecido — ou ofereçam ainda hoje — condições dignas de vida a seus cidadãos. Mas, antes como agora, isso quer dizer que a democracia só é compatível com o capitalismo, embora possa existir capitalismo sem democracia. Tal realidade nos conduz ainda a outra implicação: não existe socialismo sem ditadura, embora nem toda ditadura seja socialista.
Sim, o socialismo, como alternativa civilizatória, morreu em 1989, restando, mundo afora, não mais do que aleijões morais como Cuba, Coreia do Norte ou Angola, onde autoritários disputam com ladrões para saber quem impõe com mais determinação a sua agenda.
Mas o muro sobrevive nas mentalidades de grupelhos que aparelharam o estado brasileiro, a serviço do PT, e que se organizam para cassar direitos inalienáveis do povo brasileiro.
Não se enganem: o Muro da Vergonha que se ergue na Esplanada dos Ministérios não traduz o que se passa na alma e nos anseios da esmagadora maioria do povo. Por isso mesmo, cumpre lembrar ainda uma vez: foi o regime comunista que ergueu o Muro de Berlim, não o contrário; era a tirania com medo da liberdade, nas a liberdade com medo da tirania. Porque não havemos de ter medo. Agora é hora da coragem serena.
Recomendo a todos que assistam ao filme “Adeus, Lênin”, de 2003, dirigido por Wolfgang Becker. Trata justamente da queda do Muro de Berlim e do fim do horror comunista da Alemanha Oriental. Mas não só: ali também se compreende que a pior de todas as ditaduras é aquela que se apodera da nossa consciência.
De certa forma
De certa forma, é mesmo verdade. Vinte e sete anos depois da queda do Muro de Berlim, foi preciso erguer o nosso próprio muro, simbolizando o que Lula e o PT fizeram com o Brasil nos últimos 14 anos, para que possamos derrubá-lo.
Também daremos o nosso “Adeus, Lênin”. Vamos dar o nosso “Adeus, Lula”. E vamos aproveitar para nos despedir também de Don Corleone.Fonte:Reinaldo Azevedo