O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, vai demonstrando que é um excelente administrador do tempo e das circunstâncias. E também prova que sabe ler o sentido dos ventos com a precisão de uma biruta. Não! Não vou criticá-lo por fazer a coisa certa. Mas não vou me furtar aqui a apontar, vamos dizer, o notável atraso com que atuou nos casos de Lula e Dilma.
Qualquer observador atento da realidade sabe que Janot se preparou para qualquer resultado do jogo. Quem quer que tente atribuir a ele uma colaboração mínima que seja com o impeachment de Dilma Rousseff estará cometendo uma injustiça. Em momentos decisivos, o procurador-geral atuou em favor do “Fica Dilma”. Agora que os fatos estão praticamente consumados, nós o vemos ativo e buliçoso. E, finalmente, fazendo a coisa certa. Explico tudo.
Janot resolveu oferecer denúncia contra Lula no inquérito que apura a compra do silêncio de Nestor Cerveró, então prestes a fazer delação premiada. O senador Delcídio do Amaral deixou claro que atuava com delegação do Poderoso Chefão. O procurador-geral, ora vejam!, descobriu que um esquema como o petrolão não poderia funcionar sem a conivência de Lula.
Não parou por aí: pediu ainda que o nome do ex-presidente seja incluído no inquérito-mãe do petrolão — o que apura as safadezas na Petrobras —, junto com Jaques Wagner, Ricardo Berzoini, Edinho Silva e José Sérgio Gabrielli.
Mais: quer outro inquérito para apurar se Dilma — sim, a presidente —, Lula e José Eduardo Cardozo não se irmanaram num trabalho de obstrução da Justiça quando o ex-presidente foi nomeado ministro.
Síntese: contra o ex-presidente, uma denúncia e dois inquéritos; contra a atua, ao menos um inquérito. Os principais homens do Palácio — Wagner, Berzoini e Edinho — podem integrar a investigação-chave do petrolão.
É evidente que também eu fico tentado a dar os parabéns a Janot. Mas vou me conter.
Lembro que, não faz tempo, esse mesmo procurador-geral opinou que Dilma poderia, sim, nomear Lula seu ministro. Chegou a alegar a gravidade da conjuntura como fator e evitar embaraços para a consumação do ato. Dias depois, mudou de ideia e passou a enxergar o tal desvio de finalidade e a obstrução da Justiça. Não fosse a liminar contra a posse, concedida pelo ministro Gilmar Mendes, o homem estava lá na Casa Civil.
Noto que, então, Janot apontou esses vícios, mas, ainda assim, não pediu a abertura de inquérito contra Dilma. Aliás, a questão é de tal sorte grave e evidente que já poderia era ter oferecido uma denúncia.
Pensemos um pouco em Lula. Lembram-se do contrato de US$ 1,6 bilhão que o grupo Schahin fechou para administrar o navio-sonda Vitória 10.000? Pois é… Em razão dele, o PT deixou de pagar uma dívida de R$ 60 milhões com o grupo. O dono da empresa, além de Nestor Cerveró e de Fernando Baiano, acusaram a atuação do ex-presidente no caso. Motivo para pedido de abertura de inquérito? Por muito menos, outros estão sob investigação.
Mas Janot, prudentemente, esperou.
E foi Janot também que imprimiu especial velocidade à investigação de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), principal inimigo de Dilma, quando comparamos o seu caso com os dos demais investigados. Não que ele não mereça ainda mais celeridade, não é mesmo? Mas e os outros?
Querem mais? Janot se conformou com a leitura torta do Parágrafo 4º do Artigo 86 da Constituição, segundo a qual Dilma não pode responder no segundo mandato por crimes praticados no primeiro, ainda que esses crimes tenham colaborado para conquistar esse segundo mandato, o que é uma aberração.
Em suma: Janot postergou o quanto pôde a investigação de Dilma e Lula. Esperou que os dois fossem condenados pela ordem de fatos completamente alheios à sua atuação para só então despertar.
Não fossem as ruas, que não esperaram a vontade de Janot, a mover o Congresso, e Dilma e Lula iriam nos assombrar até 2018.
Corajosamente, o procurador-geral esperou que a dupla não tivesse mais saída para fazer, então, o que deveria ter feito há muito tempo.Fonte:Reinaldo Azevedo