Vejam estes números do Instituto Datafolha. Eles evidenciam um momento, como posso chamar?, de patologia moral do povo brasileiro, muito especialmente de sua elite. Mais: os brasucas estão padecendo de esquizofrenia lógica.
Lembro-me de uma conversa, não faz muito tempo, em que o interlocutor, com impressionante — como eu poderia chamar para ser doce? — “inocência” me dizia sobre a possibilidade de inflamar os corações dos brasileiros em defesa da reforma da Previdência. Bem, eu, sabem cumé?, ainda nem tão velho como o diabo, mas nem tão jovem como coroinha, adverti: “Isso não vai acontecer! Corremos é o risco de a reforma não ser aprovada. Brasileiro gosta de estado: branco, preto, rico, pobre, analfabeto, universitário, esquerda, direita…”.
Por que costumo afirmar que o governo Temer é quase um milagre caído do céu? Porque é a chance que tem o país de fazer a reforma da Previdência e a reforma trabalhista. Ou agora ou nunca. E, se nunca, a condenação à mediocridade! Mas, ora vejam, a maioria não quer, certo?
E não é pouca coisa, não! 71% se dizem contrários; só 23% aprovam; 5% preferem o não saber, e a coisa é indiferente para 1%. “Ah, esse governo se comunica mal…” É mesmo? Digamos que seja verdade. Mas, por acaso, teríamos 76% de pessoas com curso superior no país que são incapazes de ler um texto ou fazer uma conta?
É espantoso! Aí está a maior resistência à reforma, contra “apenas” 64% que têm o ensino fundamental. A rejeição já salta para 73% entre os com ensino médio. Sabem o que isso significa? Maior consciência dos próprios privilégios. Entre os funcionários públicos, a rejeição salta para 83%. É… Deve ser gostoso se aposentar com o salário integral, sabendo que a pobrada paga a conta, né?
Começo a entender o que significou a expansão, razoavelmente acelerada, do ensino universitário no país nos últimos 20 anos… Que medo! Então o grupo que, em tese, tem mais condições de estar bem informado é o que mais se opõe? Vergonha alheia. Respondam sem piscar: “nove vezes sete?”.
No corte de renda, os mais ricos também dão vexame — e, de novo, são os que mais teriam condições materiais de entender o que está em curso: é de 70% a rejeição entre os que ganham até dois salários; sobe a 74 entre os de 2 a 5. Depois, cai um pouco, mas ainda nas alturas: 68% entre 5 e 10 e 65% entre os mais de 10. As mulheres são mais refratárias do que os homens, embora, segundo a proposta, possam se aposentar antes: 73% a 69%.
O item mais rejeitado é o que prevê 40 anos de contribuição para ter direito ao teto da aposentadoria. O QUE É ESPANTOSO? QUEM CONTRIBUI PELO SALÁRIO MÍNIMO PODE SE APOSENTAR COM 25 ANOS DE CONTRIBUIÇÃO. E agora o dado estupefaciente: isso representa mais de 60% dos beneficiários.
Nem os itens nos quais o governo cedeu, atendendo a pressões corporativistas, conseguem a maioria. Opõem a que militares se aposentem antes 58% (38% aprovam). Reprovam o benefício para os policiais 55% (a 42%); no caso dos professores, a rejeição ao item é de 54% a 44%.
É, senhores… Estou quase aqui a ressuscitar personagens de Gil Vicente: aquele chamado “Todo Mundo” quer mamata; e o outro, o “Ninguém”, faz as contas. Querem o quê? Ainda que declinante, chega a 52% os que acham que o brasileiro, pasmem!, se aposentam mais tarde do que deveriam. Os que veem a idade como adequada são 38% — 27% em julho do ano passado. E caiu o índice dos que dizem que o brasileiro se aposenta cedo demais: de 11% para 8%.
O Congresso
Que efeito coisas assim terão no Congresso? Vamos ver. Espero que os senhores parlamentares considerem que é preciso, que palavra empregarei?, muito altruísmo para alguém apoiar uma reforma que pode lhe impor uma cota extra de trabalho em relação ao anteriormente imaginado. Parte considerável dessa rejeição pode ser apenas inércia, não uma atitude militante.
Esse Congresso, que vive sob o porrete da direita xucra e seu moralismo embusteiro, tem de pensar, olhem só o que vou escrever, no “bem do país” e aprovar o texto como está.
Se 71% dos brasileiros escolhem o suicídio coletivo ao responder a uma pesquisa, acho que o Congresso tem a obrigação de salvar o povo de si mesmo.
Grunhidos
Estou aqui a me lembrar dos grunhidos dos xucros a cada vez que o governo recuou aqui e ali. Pois é… Mesmo assim, aí estão os números, não é?
E o PT — ver post anterior — que já foi à TV, por intermédio de Dilma, defender a reforma da Previdência pretende agora ser o beneficiário maior da recusa.
A direita xucra e os fanáticos da Lava-Jatismo dos Santos dos Últimos Dias de Dallagnol estão de parabéns! Aliás, os senhores procuradores, que ganham os salários mais altos do funcionalismo, são contra a reforma.
Eles convenceram a esmagadora maioria do povo brasileiro de que as únicas tarefas dignas no país são caçar bandidos e cassar políticos. Melhor se der para caçar e cassar numa pessoa só. Ninguém tem legitimidade para mais nada.
Essa é a obra literalmente escarrada pela direita xucra, tendo como herói o esquerdista “tuiuiú” Rodrigo Janot.
Encerro
A Previdência responde por escandalosos 57% dos gastos do governo. Esse, lá vamos nós, roubo bilionário perpetrado a cada ano traz consigo vários petrolões.
Como não dá para decretar a prisão preventiva de ninguém nesse caso nem expedir um mandado de condução coercitiva, os brasileiros vão arcando com o roubo sem saber, mas pagando o pato em juros estratosféricos, escolas ruins, saúde precária, vida sem futuro digno. Mas a maioria não quer que nada mude nessa área, certo?
Se o Congresso se acovardar, melhor o brasileiro ir brincar de outra coisa.Fonte:Reinaldo Azevedo