terça-feira, 31 de dezembro de 2019
Maioria prefere investimento em área social a segurança para combater violência
A maioria dos brasileiros acredita que, para combater a violência, o governo deve priorizar investimentos na criação de empregos e na melhoria da educação, e não especificamente na área da segurança, como no treinamento e na compra de equipamentos de policiais.
É o que aponta pesquisa Datafolha feita em dezembro deste ano. Para 57% dos entrevistados, é mais importante investir em áreas sociais do que na segurança. O investimento em polícias é mais importante para 41% . Outros 2% responderam que não sabem.
Esse índice é alto mesmo entre quem apoia o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que se elegeu com um discurso de endurecimento da segurança pública.
Entre os que avaliam o governo como ótimo ou bom, 51% acreditam que se deve investir mais nas áreas sociais, e 47% acreditam que se deve investir mais em polícias.
Para o antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário Nacional de Segurança Pública, uma série de fatores pode alterar essa percepção. Se houve um crime cruel e de grande repercussão, por exemplo, a tendência da sociedade é enfatizar aspectos repressivos, o que não acontece em outros momentos.
"Mas é uma constatação preciosa. A despeito de retóricas ideológicas e muito caricatas, que promovem identificações superficiais, há sempre espaço para argumentação, reflexão. Quando as questões sociais são tão graves e dramáticas, como são no Brasil, com desemprego tão grande, há evidência suficiente da origem dos problemas. As pessoas são capazes de tirar suas conclusões, entendendo como a crise social afeta comportamentos", diz ele.
A socióloga Samira Bueno, diretora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, afirma que a pesquisa mostra que "há uma consciência de que a desigualdade está diretamente vinculada à violência".
"Não à toa, os territórios que concentram os maiores índices de violência são os de maior vulnerabilidade social", diz.
A avaliação de homens e mulheres sobre o tema não varia além da margem de erro. O que influencia mais essa percepção é idade, escolaridade e renda dos entrevistados.
Em geral, quanto menor a faixa etária dos entrevistados, mais a percepção pende para a área social.
Renda e educação formal também pesam a balança: entrevistados mais pobres e menos escolarizados tendem a defender mais investimentos na polícia. Uma das poucas categorias em que há mais entrevistados que defendem que violência se resolve com policiamento é entre os brasileiros que estudaram só até o ensino fundamental.
Moradores de cidades do interior defendem mais investimento em polícias do que quem vive em capitais e cidades em regiões metropolitanas do país.
O Sudeste é a região em que menos se acredita que a solução da violência é investir na polícia: 35% dos entrevistados. Por outro lado, o Nordeste é a região com a maior taxa, 47%. Alguns dos estados brasileiros com os maiores índices de homicídio do país estão nessa região.
Para Soares, uma das explicações possíveis é que "quem está mais diretamente exposto à violência se sente desprotegido e tende a enfatizar medidas mais imediatistas, que possam de alguma maneira aliviar sua angústia e medo".
"Para pessoas que veem a violência mais de longe, os problemas são importantes, mas não tão urgentes. Elas podem contemplar um horizonte um pouco mais amplo e ponderar que, se não houver mudanças mais consistentes e profundas a médio prazo, tudo acaba se perdendo", afirma.
Bueno diz que a violência pode influenciar essa opinião, mas os índices também podem mostrar que, em regiões mais pobres e mais afastadas, a população tem uma demanda maior pelo Estado.
"Isso pode estar conectado ao padrão de desenvolvimento do território. No Sudeste estão algumas das polícias mais antigas e estruturadas do país, com efetivos relativamente grandes, e que se mostram mais presentes para a população. Uma pessoa no interior de São Paulo tende a perceber mais a presença da polícia que uma pessoa no interior do Piauí e de Alagoas, por exemplo", afirma.
MEDO DE SAIR À NOITE
A pesquisa Datafolha mostra ainda que 72% da população brasileira diz ter medo de sair às ruas de suas cidades depois que anoitece.
Do total, 50% afirmou ter muito medo, e 22% disse ter um pouco de medo. O índice é bem maior entre mulheres - grupo em que 79% dizem temer andar à noite. Entre os homens, esse índice é de 63%.
Mais pobres e mais velhos também têm mais medo de andar nas ruas durante as noites: 75% dos que ganham até dois salários mínimos e 78% dos que têm mais de 60 anos disseram temer andar à noite.
Esse temor, no entanto, é menor em cidades pequenas. Enquanto 37% dos que vivem em lugares com até 50 mil habitantes disseram não ter medo de sair à noite, o índice cai para 21% nas cidades com mais de 500 mil habitantes.Fonte:Folha