terça-feira, 18 de fevereiro de 2020
Governadores tentam impor limite nas relações com Bolsonaro - mas ele ultrapassa
Não é apenas corporativismo que motiva uma carta de apoio a Rui Costa (PT) no embate do governador com o presidente da República, Jair Bolsonaro. Parece que os 20 signatários do documento querem demarcar uma fronteira para evitar que o limite seja cruzado pelo presidente também contra eles. A despeito dos surfistas da onda bolsonarista de 2018 que já mudaram de lado, todavia, nenhum autêntico seguidor do chefe do Executivo assinou a carta. Sinal que o espírito de corpo funciona para a maioria, mas não é unanimidade.
Infelizmente, parte da classe política optou por transformar adversários em inimigos. Para o bolsonarismo, vale até mesmo os ocultos, que sequer existem, mas conseguem amedrontar a qualquer passo. O caso da morte do miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega é o mais recente, porém nunca foi isolado. E não é uma questão de mudar a forma como as coisas são ditas. É uma questão do conteúdo, problemático por si. Bolsonaro esbraveja preconceitos. Mas se antes eles estavam concentrados a personificações da esquerda, agora atingem também as unidades da federação. Por isso a demarcação de território se tornou tão relevante.
Ao atacar de maneira tão incisiva o governador baiano, o presidente sinalizou que qualquer um pode ser alvo de críticas imponderadas, bastando apenas contrariar os interesses dele. Mesmo que Rui Costa tenha pesado a mão ao associar o miliciano à família Bolsonaro – apesar dos inúmeros elementos que permitam isso -, a nota emitida pelo chefe do Palácio do Planalto foi deveras descortês. Tratando, inclusive, o caso de Adriano Magalhães da Nóbrega como similar a outras condenações - nenhuma envolvendo diretamente a morte de pessoas, conforme sugerem as investigações no caso do ex-PM fluminense.
É inconveniente ter que falar reiteradas vezes sobre essa tensa relação que Bolsonaro tem construído com outros entes da federação. A existência de divergências políticas é algo salutar no processo democrático. Se o debate for realizado no plano das ideais, é saudável para todos os envolvidos. O problema é que não parece haver qualquer disposição para fazê-lo. É mais fácil atacar, atacar e atacar e esperar que o revide sirva como combustível para mais brigas, sem que tenha havido qualquer avanço no debate sobre políticas públicas ou mesmo evolução no funcionamento do Estado brasileiro como um todo.
Antes em silêncio, os governadores passam a contra-atacar. Foi assim com o desencontrado desafio de zerar o ICMS de combustível, uma fala extremamente populista e que afetaria o equilíbrio fiscal dos estados. Foi assim agora com o desrespeito a uma unidade federativa, que se sobrepõe ao governante que, por hora, a comanda. Se limites continuarem a serem cruzados tão cotidianamente, uma hora não haverá uma linha tênue sequer a nos separar da anarquia.