Durante a pandemia da Covid-19 a azitromicina ultrapassou as barreiras das prescrições médicas, bulas e balcões de farmácias, e adentrou o debate sobre o tratamento da infecção pelo novo coronavírus. O combo formado pelo medo da pandemia, que trazia números alarmantes, um vírus pouco conhecido, e ainda a ausência de medicamento e vacina fez com que os brasileiros acreditassem e se submetessem a práticas que potencializam os riscos e ainda podem prejudicar outras pessoas, como o uso indiscriminado e sem prescrição médica de antibióticos.
Informações sem fundamento científico que sugeriam o uso do medicamento como prevenção da doença circularam, e chegaram a convencer algumas pessoas de que o efeito era positivo, tanto que houve quem o utilizasse. Porém, as ações durante a crise sanitária podem ter efeito lá na frente em uma nova crise, dessa vez desencadeada por responsabilidade humana.
Ao utilizar esse tipo de remédio sem receita a pessoa não só se coloca em perigo, como oferece perigo para todos em volta, porque contribui para o desenvolvimento de bactérias super-resistentes. O farmacêutico e professor da UniFTC, Mauro José Bitencourt, cita que a estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) é de que cerca de 700 mil pessoas morram no mundo a cada ano com infecção bacteriana resistente. Além disso, o órgão ainda reconhece a possibilidade de que nos próximos 10 anos esse total pode aumentar 10 vezes. O número é alto, chocante e deve servir de alerta.
A azitromicina é um antibiótico usado no tratamento de várias infeções bacterianas. Entre as indicações mais comuns estão o tratamento de otite média, faringite estreptocócica, pneumonia, diarreia do viajante e outras infeções intestinais.
Os riscos de uso indiscriminado, sem prescrição ou recomendação médica de antibióticos já são conhecidos. “Se trata de um problema gravíssimo, de saúde pública”, enfatizou o farmacêutico. Diante desses perigos e como forma de alerta para a população e profissionais da Saúde, todos os anos no mês de novembro entidades de saúde realizam ações durante a “Semana Mundial de Conscientização Sobre o Uso de Antibióticos”, de 18 a 24 de novembro.
Bitencourt esclarece que antibiótico só serve pra uma coisa: “matar bactéria ou inibir infecção bacteriana”. “Não existe comprovação de que a azitromicina ou qualquer outro antibiótico combata vírus”, destacou o especialista, que ainda argumentou que a substância serve exclusivamente para infecção bacteriana. “Febre, gripe, dor ou qualquer outro agravo, antibiótico não serve”, ponderou.
Ele ainda explica que esta classe de medicamentos desde 2010 é controlada. Com isso, os antibióticos passaram a ser adquiridos apenas com prescrição de médicos, dentistas ou veterinários. “Se uma farmácia dispensar sem receita está promovendo ação fora da legislação”, destacou.
O aviso do especialista não é direcionado apenas à população. Segundo o farmacêutico, 50% das prescrições deveriam e poderiam ser evitadas. “O prescritor também pode errar”, reconheceu Mauro Bitencourt.
“Para conter a infecção bacteriana o antibiótico tem que estar em concentração adequada no sangue. O uso do medicamento tem que ser feito corretamente, no horário correto, só assim consegue concentração plasmática capaz e combater a infecção. Caso se use quantidade menor ou interrompa antes do período adequado, ao invés de combater, fortalece a bactéria, fazendo com que ela desenvolva resistência”, elucidou.